por: Kathy
Eu me lembro perfeitamente de quando ganhei o livro "Confissões de Adolescente". Era uma febre na época, todo mundo tinha, todo mundo comentava. As "meninas do Confissões" saíam em matérias da Capricho (minha revista favorita, que bonitinha! rs), fizeram peça de teatro, enfim, foi um sucesso! Me lembro também que adorava especialmente assistir o seriado de mesmo nome que passava na TV Cultura e que tinha uma abertura linda, com aquela trilha gostosa de "Sina" do Djavan: "O luar, estrela do mar, o sol e o dom, quiçá, um dia a fúria... Desse front virá lapidar..." Vocês lembram?
Fiquei passeando por essas lembranças ontem quando recebi aqui em casa (cortesia da Agir Editora para o Mamíferas) o novo livro da atriz e roteirista Maria Mariana, ela mesma, a autora de Confissões de Adolescente. Fiquei espantada quando percebi que já se passaram 17 anos desde o lançamento do primeiro livro. Sim, eu tinha 13 aninhos quando li pela primeira vez "Confissões". Mais espantada ainda fiquei ao saber que a Maria Mariana, hoje com 36 anos, é mãe de quatro filhos, e que seu novo livro fala exatamente do assunto que mais povoa minha vida no momento: maternidade.
O lançamento de "Confissões de Mãe" chega acompanhado da reedição de "Confissões de Adolescente". A idéia de Maria Mariana é escrever para seus filhos (três meninas e um menino, que hoje têm idades entre 2 e 9 anos) sobre suas impressões e aprendizados da vida como mãe. "Hoje vejo, sinto na pele, a grandeza desse lugar de mãe. E daqui a vinte anos, como será? O tempo! O tempo tudo transforma. Preciso escrever já!", diz ela logo no inicio do livro, justificando a necessidade de deixar registradas para a posteridade (e em especial para seus filhotes) a sua maneira de vivenciar a maternidade.
Nos relatos do nascimento de seus quatro filhos (uma cesárea e três partos normais hospitalares), Mariana descreve as emoções e sensações do trabalho de parto. Assume que chegou ao primeiro parto despreparada, apesar de ter lido muito e se informado (assim como eu, inclusive), subestimando a dor e sem imaginar o quanto as intervenções hospitalares podem ser prejudiciais ao processo. Ela descreve claramente, por exemplo, o quanto a ocitocina colocada em sua veia, estimulando artificialmente as contrações e causando uma dor insuportável, acabou transformando seu sonhado parto normal em uma cesárea. Vejam um trecho:
"(...) o parto natural me atraía de forma arrebatadora, inexplicável. Como uma necessidade do meu corpo, do meu espírito. (...) Mas, apesar das buscas, cheguei ao parto despreparada. Não tinha a dimensão da grandeza desse momento. Não sabia o quanto a mulher está só durante o trabalho de parto. No íntimo, alimentava a fantasia de que, para mim, não doeria tanto. A verdade é que estava afundada num poço de prepotência, contava com a vitória! (...) Estava caminhando bem. As dores apertavam. A platéia aguardava o show. Com 7 centímetros de dilatação, o anestesista me ofereceu a palavra mágica: ANESTESIA! (...) Só que Clara ainda estava na barriga! E a verdade é que, uma vez plugada pela veia, eles fazem o que querem de você. Estimularam as contrações com remédios. (...) A dor estimulada qumicamente vem sem avisar, vem cruel, vem fora do caminho natural. Fui pega de surpresa por aquela dor-avalanche. Meus nervos se descontrolaram. (...) Implorei pela cesárea em desespero e todos concordaram. (...) Clara nasceu bem. Com seus lindos olhos azuis bem abertos! Demorei quase dois meses para me recuperar. Também levei um tempo para aceitar meu sentimento de frustração. A segunda seria diferente." (Maria Mariana sobre o parto de sua filha Clara - fevereiro de 2000 - retirado do livro Confissões de Mãe)
No decorrer do livro, Mariana vai respondendo para seus filhos, de sua forma, questões como "Quando devo ter filhos?", "Como é ficar grávida?" "Dói parir?" "Amamentar é bom?", e, entre um e outro texto, aparecem em forma de tópicos algumas dicas sobre gestação, parto natural, amamentação e até shantala.
Gostei demais da sensação de volta ao passado que esse reencontro com um livro de Maria Mariana me proporcionou, mas confesso que, apesar da leitura agradável, Confissões de Mãe não me pegou "em cheio" como Confissões de Adolescente me atingiu há 17 anos atrás.
Acho louvável a preocupação da autora em falar com segurança sobre sua escolha em ser mãe tempo integral, opção que tantas vezes é mal interpretada. Gosto muito também de suas declarações sobre a dor no parto, tratando essa dor como um aprendizado, uma transição necessária, como tantas vezes repetimos aqui no Mamíferas, e não como uma tortura insuportável ou um sofrimento.
Outros temas que repetimos à exaustão aqui no blog surgem aos montes como por exemplo: o respeito à mãe na hora do trabalho de parto, a importância de escolher um médico ou equipe consciente dos benefícios do parto normal, a entrega constante e a troca deliciosa que acontece durante a amamentação, por exemplo.
Em certos momentos, porém, Mariana parece "ditar regras", o que me incomoda um pouco. Diz, por exemplo, que a idade ideal para ser mãe é entre 20 e 30 anos de idade "Antes é cedo e depois é tarde". afirma, admitindo que é possível administrar esse tempo, mas classificando essa escolha como "trabalhosa". Afirma também que a missão da mulher é ser mãe, algo com o qual definitivamente não concordo. Talvez seja a minha missão, mas pode não ser a sua nem a de outra mulher, afinal... Outra coisa que me incomoda um pouco é o excesso de "Deus", de "Divino" de "Pai", que surge no livro como uma entidade superior a tudo e que controla tudo, algo que não me identifico, pelo menos não dessa forma colocada.
Certas dicas também me soaram um pouco ultrapassadas ou incompletas. Claro que o tom geral do livro é o de dividir experiências "de mãe pra mãe", mais ou menos como fazemos por aqui, mas não acho muito legal falar, por exemplo, sobre aquela velha história de preparar os seios para a amamentação com bucha vegetal. É algo ultrapassado e que sabemos que pode ter efeito contrário: machucar mais a pele e prejudicar ainda mais a amamentação.
Ela também não toca num ponto importantíssimo sobre amamentação: corrigir a pega do bebê quando há rachaduras nos seios e dor. Apenas sugere o sol e o ar livre para cicatrizar as rachaduras (o que também ajuda muito, mas se a pega não for corrigida, a rachadura acaba aparecendo novamente). Enfim, esses são pequenos exemplos, mas acho que nesse ponto algumas coisas ficam superficiais demais, e nessa fase o que a gente mais precisa é de aprofundamento, de informação até dizer chega.
Gostei das dicas sobre trabalho de parto. Talvez soem repetitivas para nós que estamos acostumadas a tratar o tema no dia-a-dia, mas para as mães que estão saindo agora da "Matrix", conselhos como não chegar cedo demais no hospital, descansar muito entre as contrações, se focar no seu objetivo (no caso o parto normal) e ainda esse trecho que me deixou muito feliz, o nosso velho mantra: "Escreva essa frase na sua memória, piche suas paredes internas e não esqueça ESSA DOR PASSA!". Definitivamente não é o tipo de informação que vemos por aí em todo lugar. Saldo final positivo, portanto. Livro indicado não para as mais "veteranas" da humanização, mas para quem acaba de engolir a famosa pílula vermelha...
Livro: Confissões de Mãe
Autora: Maria Mariana
Editora: Agir Equilíbrio
Preço sugerido: R$ 29,90
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