
por: Tata
A filha de uma amiga, que tem 4 anos e meio e ainda mama, sofria na escola com a encheção dos colegas e das professoras, que diziam que mamar era coisa de bebê, que criança grande mamando era muito feio. Passou a mentir, dizendo que já não mamava mais no peito, agora tomava mamadeira.
Uma outra amiga, quando conversava pacientemente com o filho, que fazia uma birra qualquer no supermercado, foi rudemente abordada por uma moça: "se fosse meu filho, já tomava logo uns tapas. fica passando a mão na cabeça dele, que daqui a alguns anos ninguém aguenta essa criança!".
Outra amiga, ao contar para os pais que não voltaria da licença-maternidade aos quatro meses do filho mais novo, e que deixaria outras atividades em segundo plano para se dedicar prioritariamente ao bebê por um tempo, ouviu todo tipo de cobranças e implicâncias. Sermões e mais sermões sobre a dificuldade de voltar ao mercado de trabalho depois de um tempo fora, sobre a dependência doentia dos filhos que não vão para a escolinha cedo, sobre as mulheres que descuidam da aparência e do casamento e acabam 'largadas pelos maridos'.
Mais uma amiga, essa grávida de uns seis meses, foi comentar com o irmão e a cunhada que havia optado por um parto natural, domiciliar. Ouviu como resposta uma saraivada de comentários indignados, afinal, 'sentir dor é coisa do passado', e 'a tecnologia está aí pra facilitar a vida, pra quê abrir mão'. Teve de aguentar um papo interminável sobre como a cesárea é mais rápida, segura, indolor, prática, limpa.
Quando eu estava grávida da Chiara, um dia passeava com as duas mais velhas e a barriga de uns sete meses, quando fui abordada por uma senhora: "menina, você já tem duas e está grávida de novo?? que irresponsabilidade, como você deixou isso acontecer??".
Já perdi a conta de quantas vezes ouvi que sou egoísta porque trato minhas filhas com homeopatia e opto sempre por opções não-invasivas, respeitosas. Dizem que estou querendo 'provar uma teoria', que me importo mais em estar sempre certa do que com a saúde delas.
Sabem aquela música do Nando Reis, lindamente cantada pela saudosa Cássia Eller: "o que está acontecendo? o mundo está ao contrário e ninguém reparou...". Pois é. É exatamente assim que eu me sinto, quando o assunto é gravidez, parto, maternidade.
Quando foi que as coisas mudaram a tal ponto que mamadeiras e chupetas viraram o denominador comum, enquanto peitos de fora e colo à vontade são coisa de gente 'alternativa'? Desde quando mães que batem educam melhor do que mães que conversam, respeitam, ensinam? Em que ponto a cesárea virou o normal, e o normal passou a ser a exceção? Quando foi que as mães passaram a ter a obrigação de 'retomar a vida' o mais rápido possível, e cuidar dos filhos deixou de ser prioridade? Desde quando ter mais do que dois filhos deixou de ser opção pessoal e desejo de ter uma família grande e cheia de amor pra dividir, e passou a ser sinônimo de irresponsabilidade e falta de planejamento? Porque é que optar por caminhos mais naturais para cuidar dos desequilíbrios do organismo é 'coisa de natureba', e não a busca por uma vida mais saudável e equilibrada??
Quanto mais eu penso, mais eu me convenço: sou mesmo uma 'diferente', uma 'desajustada'. Ponto fora da curva, como diz meu marido.
E ainda bem.
* trecho de 'Relicário', de Nando Reis, mais um título musical para a nossa coleção... ;-)
Imagem: http://tatimolini.wordpress.com/2008/07/