A festa do ultrassom

por: Kathy

A Kalu falou um pouco sobre isso recentemente aqui, mas tive vontade de complementar e explicar mais coisas. Nem cheguei a ver a reportagem inteira, mas li outro dia na capa da Folha de S. Paulo uma chamada para uma matéria sobre mães que alugam aparelhos de ultrassom pra mostrar o bebê que está na barriga pra toda família. Jesus, até me arrepiou essa história, sabiam? O título da matéria era "Ultrassom agora é festa". Procurei a versão on line, mas é fechada pra assinantes.

Mas devo dizer que fiquei chocada! Imaginem só, já acho um absurdo as grávidas que fazem ultrassonografias em todas as consultas de pré-natal, acho um crime médicos que mantém aparelhos de ultrassom em seus consultórios, imaginem só vocês o que eu penso de alguém que aluga um aparelho pra fazer isso em casa!? Assim, só pela graça de mostrar o bebê mesmo, sem finalidade alguma. Isso ao custo de 1500 a 2 mil reais!

Fazer o exame duas ou três vezes durante a gravidez é muito mais do que suficiente. Conheço algumas mães que fizeram até menos. Conheço outras que não fizeram nenhum. Entendo e compartilho da vontade de saber como o bebê está, de repente saber também o sexo da criança. Acho legal guardar o vídeo do ultra e algumas "fotos" de recordação. Sei o quanto é lindo ver nosso bebezinho perfeitinho pela tela, saber que ele está crescendo e se desenvolvendo, mas pra que esse exagero todo?

Fazer exames demais sem necessidade é um desperdício de tempo e de dinheiro. É também uma mão na roda pra médicos intervencionistas, que começam a enxergar nas imagens do ultrassom "problemas" e mais "problemas" como pouco líquido, baixo peso, peso alto, cordões enrolados, possívels "má formações" e mais uma imensidão de motivos para uma cesárea "emergencial" marcada para o dia seguinte (ué, não era emergencial?). Fora que qualquer probleminha "detectado" no ultrassom já tira o sono da mãe, deixa os pais preocupados, atrapalha a gravidez mesmo.

2D, 3D, 4D, daqui a pouco estaremos entrando na barriga com uma câmera pra ver o bebê! Além de ser caro, desconfortável - a posição do ultra para mamães com barrigas já grandinhas é terrível, dolorida, só perde mesmo pra posição tradicional de parto vaginal (irônico, não) - não há certeza absoluta de que ultrassons sejam inócuos para os bebês, e o risco pode se agravar dianta da repetição excessiva desse tipo de exame.

Acho engraçado ver algumas mulheres grávidas completamente paranóicas, com medo de pintar o cabelo, medo de passar creme hidratante, de passar esmalte na unha, de sei lá mais o que, e divulgando felizes da vida que o obstetra é Ó-TI-MO, tem "até aparelho de ultrassom no próprio consultório, imagina, que beleza?"... Pffff... Pois sim, viu? Falta de noção mandou um abraço!

Imagem: http://blogdolele.blog.uol.com.br/images/Ultrassom.JPG

O mundo atrás das janelas

por: Kalu

Na caixa preta aparece uma história diferente daquela que estavam acostumados a ver diariamente nas aventuras ilusórias alheias: uma imagem preto e branca, cheia de curvas, que com a força da imaginação se trasnforma nas partes do corpo da criança que o doutor descreve. O pequeno feto se movimenta, coloca a mão na boca e muitas vezes no rosto. Será que a luz incomoda? O que importa?

Do lado de fora a mãe se emociona e se sente mais mãe. O pai que até então não conseguia imaginar nada naquele lugar que sempre desejou com volúpia, passa a entender que aquele é o abrigo de sua genética e continuidade de sua própria existência.

O médico indica um amigo que faz um ultrassom 3D, cobrando uma pequena bagatela de alguns cem reais. Mas para aquela família vale a pena. Começam com a escolha da maternidade como quem faz a opção por um hotel: quarto com Tv, câmera nos bercinhos, para acompanhar o bebê na enfermaria para a telinha, mostra o doutor durante a consulta. eles comemoram que a foto do bebê vai para internet para quem quiser conhecê-lo. Logo fazem a encomenda para que o tio traga uma babá eletrônica com câmera integrada para que a ela se sinta confortável em ver seu rebento no meio da noite.

Cada ultrasson é colocado na página do bebê no orkut e em seu blog pessoal. Tão logo ela descobre uma novidade, corre para comprar: bercinho que toca música e balança sozinho, poltrona que sacode, DVDs com imagens e sons para estimular a inteligência dos bebês, mamadeiras que imitam o seio materno. Ela vive num cubículo e precisa ver o mundo através da tela para que não perceba que está na gaiola.

Todas suas experiências só fazem sentido com som e imagem. Nada nasce do lado de dentro. A mediação da tecnologia é tão fundamental para ela como ar. Ela não entende como a amiga de infãncia, que sempre fora natureba, não tenha feito um ultrassom sequer e nem sabe o sexo da criança: que Deus proteja esta mulher louca.

A amiga pariu em casa e ela acha que foi influência Gisele. Ela sempre preferiu a Claúdia Leite: mais pé no chão. Que loucura parir na banheira em casa, dormir junto com o bebê, não ter enfermeira para cuidar do rebento, dispensar o carrinho e prender o bebê em um pano. Substituir a banheira por balde? Não dar mamadeira, nem chupeta. Coitada da amiga, pensa ela, fica o dia de peito de fora dando de mamar para o bebê e não pretende voltar para a louca rotina de trabalho. Que loucura, comenta com o marido por MSN:  a amiga abriu mão da vida para viver em função de seu filho. Ela, que  nem conseguiu amamentar depois de uma depressão grave e não ve a hora de voltar a trabalhar. É uma mãe moderna e para quê inventar?

Sua amiga é raridade e segue os passos das mulheres de antigamente com a difernça que fez porque escolheu por conta própria. Uma louca: para que abrir mão da tecnologia, aparatos e trabalho?  A amiga vem com aquele discursos revolucionário de que antes da pílula, a mulher no mercado de trabalho, a única opção era cuidar da casa e filhos. Mas a mulher foi tão para fora que não se conecta mais com o lado de dentro. Esqueceu de seus ciclos sagrados. Elanão está nem aí, dá mais importãncia para o destino da personagem da novela que para sua louca amiga que acha que vai mudar o mundo parindo em casa e revolucionando a vida com um bebê que não precisa de coisas. Onde este mundo vai parar...      

* Personagens fictícios