por: Tata
Eu vivi duas experiências de parto muito diferentes. Na primeira gestação, planejamos um parto domiciliar de gêmeas, mas acabamos em uma transferência para o hospital 'aos 45 do segundo tempo', e Ana Luz e Estrela nasceram de um parto normal cheio de intervenções indesejadas. Agora, na segunda gravidez, planejamos novamente um parto domiciliar, e ele veio. Com 41 semanas e 4 dias, Chiara nasceu na sala da nossa casa, em um parto natural que me fez viver tudo o que sonhei há quatro anos atrás, mas não pude experimentar.
Eu me lembro até hoje do primeiro dia no hospital, depois que as meninas nasceram. A felicidade era imensa, claro. Eu tinha minhas filhas nos braços, saudáveis, lindas. Eu havia me tornado mãe, começava a descobrir o amor mais imenso do mundo. Por outro lado, uma dor aguda por tudo o que sonhei, mas não vivi. A frustração imensa por todos os planos interrompidos, pelo sonho deixado pela metade.
Naquela hora, nada era pior do que ouvir comentários do tipo: "o que passou, passou, o importante é que você está bem, suas filhas estão bem, isso é que importa!". Ora, é claro que isso importava! Mas a minha dor também era importante. Eu não podia e não queria ignorá-la.
Pra muita gente, pode parecer bobagem. Coisinha sem importância. Mas pra mim, não era. Eu sonhei muito com o nascimento das minhas filhas, desejei uma porção de coisas, imaginei como seria inúmeras vezes. Tudo ter saído ao contrário foi doído. Não tinha como não ser.
Para mim, não havia outra forma de viver saudavelmente essa experiência, a não ser me permitindo viver a dor da perda, saborear o 'luto' pelo parto que não vivi. Foi mergulhando sem medo em meus sentimentos, me permitindo viver por inteiro o que havia ali para ser vivido, que pude compreender o que havia para ser compreendido, aceitar o que havia para ser aceito, chorar o que havia para ser chorado, e curtir o que havia para ser curtido. Quando 'pari' meu relato de parto, no dia em que minhas meninas completaram dois anos de vida, foi como uma libertação: pude então abrir os braços e permitir que a dor se fosse. E dali por diante, guardei apenas sentimentos bons em relação ao nascimento das minhas meninas: a felicidade imensa de tê-las nos braços, depois de tanto sonho e tanta espera; a alegria intensa da maternidade; a doçura do primeiro passo de uma estrada que caminharíamos e caminhamos juntas, por muito e muito tempo.
Hoje, eu olho pra trás e relembro meu primeiro parto com um carinho imenso. Ele não foi o que sonhei, mas talvez tenha sido o que eu precisava viver. Porque aprendi demais com ele, e com tudo o que veio depois. Cresci, amadureci, melhorei.
E foi graças a tudo o que vivi há quatro anos atrás que pude viver, há algumas semanas, um segundo parto redentor, intenso, irretocável. A Renata que eu era há quatro anos atrás talvez não pudesse ter vivido esse parto. A Renata que eu passei a ser depois de tudo o que vivi, essa sim, estava pronta para ele.
Nem tudo na vida sai do jeito que a gente gostaria. Se fosse assim, não haveria aprendizado. Porque é nos descaminhos que a gente tem a oportunidade de refletir, repensar, aprender. É claro, ninguém quer ver seus planos caírem por terra, a gente quer conseguir tudo aquilo o que sonhou, sempre. Mas às vezes, não dá. Por esse ou por aquele motivo, não dá. E aí? Aí, o que resta é a gente se refazer, chorar as dores e, como dizia a música, levantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima. Sem negar a dor, sem fazer de conta que tudo bem. A idéia não é ser Polyana. É saber que a gente não pode mudar o que já foi, e se teve que ser, vambora aprender alguma coisa com isso.
Porque não tem jeito, é só tropeçando nas pedras do caminho que a gente aprende a levantar. E se tem uma coisa que eu venho aprendendo com a vida é que a gente sempre, sempre levanta melhor do que caiu.
Imagem: http://www.gettyimages.com.br/
5 comentários:
É Rê, é dolorido mesmo perder um sonho assim no meio do caminho e pior ainda quando os outros fazem pouco caso.
Seu post foi ótimo, realmente devemos tirar um aprendizado de tudo. Até das experiências ruins, até pra saber o que não fazer de novo, do que se proteger...
Tive esse luto com o parto que não aconteceu e a amamentação, dessa segunda vez estou me cercando de tudo que está ao meu alcançe para que não passe por tudo isso de novo, só a gente sabe o que sofre.
Mas eu tenho a consciência do quanto me fortaleci com essas experiências negativas e acordei de verdade pra vida, exigi de mim mesma ser a melhor mãe que poderia ser depois de ter falho nessas duas partes. Talvez quem sabe, se eu tivesse tido um parto e amamentado eu não teria saído da matrix e não seria metade da mãe/mulher que sou hoje.
Tudo é válido nessa vida, e as pessoas que tripudiam em cima das nossas experiências deveriam se humanizar um pouquinho mais, pensar antes de falar ou melhor ainda não falarem nada!
Ótimo post mesmo, você é uma das minhas maiores inspirações.
beijo no coração!
Tatá,
Tive um parto normal hospitalar, e outro natural na casa de parto.
Hoje vejo que a melhor coisa é um Parto Domiciliar.
Mas acho que não vou ter filhos mais não....
Fico sempre pensando o que fazer com esse desejo não realizado....
Querida Tata,
adorei o seu post, foi realmente muito inspirador.
Bom eu ainda não sou mãe, porém gosto muito de ler relatos de parto...
Então, vc publicou o seu relato de parto das gêmeas? Se publicou, coloca o link pra gente! Tenho certeza que não só eu, mas muitas mamíferas gostariam de ler também.
Mil beijos no seu coração.
E você disse que não estava inspirada, hein?! Lindo post. Eu acho que todo parto é um grande mistério, principalmente o primeiro. A gente pode ler, saber cada etapa de um TP, mas viver na pele é outra coisa. É só lá em cena, que a gente faz o espetáculo: muita preparação, a interação com a platéia, com os outros atores e aquela pitada de sorte. As vezes as coisas são como queremos e idealizamos, mas, a maioria delas como precisamos. Meu parto foi domiciliar, quase sem assistência, sem dor. Mas as vezes eu penso que pelo menos eu queria ter sabido que aquilo que eu achei ser outro alarme falso, era meu PD. Que queria saber que os puxos, não eram uma "dor de barriga" e aquele não era o momento de fazer força. Por conta disso tive uma laceração de 3 grau, a única coisa que considero realmente ruim no meu parto. Acho que a gente sempre aprende, sempre quer fazer e saber do melhor, porque somos assim, mamíferas, buscando na alegria e na dor o melhor de nós.
Renata - Renascida.
Desde o nome ate a essencia.
Parabens!
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