por: Kalu
A pedido da Jobis, relato aqui como nasceu um paterno aqui em casa. Da mesma forma como cada mamífera tem o relato de seu próprio nascimento, o mesmo se dá com os paternos ou papíferos. Mas, qual o traço em comum neles?
Os papíferos iniciam a jornada da maternidade timidamente, afinal é difícil trabalhar com o conceito interno da fêmea que vira mãe. Eles buscam formas para estarem mais perto do bebê, tornando-se cuidadosos com a mamífera. Meu marido, por exemplo, mesmo morando em outro estado, dava seu jeito para estar presente em todas as consultas de pré-natal. Para ele sentir-se "aquele que cuida" foi gratificante e reconfortante. Aliás, ficar com a sensação de não ter função na gestação é um sentimento não verbalizado que faz parte do novo pai que nasce.
No início, o embrião do papífero é temeroso em relação a tudo. Pensa em plano A, B, C, D... E na hora P? Neste ponto nós mamíferas devemos ser o porto-seguro. Acho que quando internamente conseguimos escolher nosso parto, temos argumentos para convencê-los de nossa escolha. E saiba, um papífero vai sentir-se muito feliz por garantir que sua escolha seja realizada à risca. Por isso, se você quer um papífero é preciso ter certeza de seus caminhos. Pelo menos por aqui foi assim.
A gravidez pode gerar no papífero uma certa aversão ao tema, um comportamento como de uma criança mimada. No inconsciente dele surge o luto da mulher, o nascimento da mãe e a sensação de que ele está perdendo algo nessa história. Pedir massagens, principalmente estimular o carinho na barriga, pode ajudar a criar o vínculo entre pai-mãe e bebê.
Assim como nós temos muitos conceitos errados sobre maternidade, os homens carregam referências as vezes traumáticas. Quando engravidei meu marido disse que tinha pegado o contato de uma enfermeira para poder ficar com o bebê a noite para que eu pudesse dormir. Quando falávamos de amamentação ele dizia que o peito ia ficar caído, que era melhor desmamar o quanto antes. Sobre parto, a cesareana era escolha certa para não acabar com a área de lazer.
Neste ponto as leituras me ajudaram muito, como o livro Parto Ativo, de Janet Balaskas. Lá existe um histórico sobre o parto, referências científicas do benefício do parto humanizado. Foi a primeira leitura do meu marido que desencadeou o trabalho de parto do seu papífero interior. O expulsivo se deu depois que meu marido leu o livro Nascer Sorrindo, de Frederick Leboyer, que fala sobre a importância de um contato delicado com o recém nascido e um respeito profundo pela qualidade do nascimento. Nesta altura meu marido pensava: como poderei dar um nascimento digno ao meu filho? A resposta era simples: em casa seríamos senhores de nossas decisões.
As reuniões com as enfermeiras que fariam meu parto foram fundamentais para elucidar as dúvidas:
- E se não der tempo?
R: O trabalho de parto costuma demorar e os sinais aparecem bem antes, permitindo com que possamos estar presentes. - E se der algo errado?
R: No primeiro sinal de anormalidade a mamífera será levada para um hospital. - Qual a minha função durante o parto?
R: Aquela que você quiser e sentir-se mais apto a fazer. Durante o Trabalho de Parto você pode fazer massagem nas costas dela, para aliviar a dor; segurá-la no expulsivo e cortar o cordão quando o neném nascer.
Como meu marido já tinha lido os dois livros mencionados, sabia que não era preciso fazer raspagem, episiotomia, lavagem. Nosso filho não seria aspirado ou revirado. A chave para tudo foi conversar longamente, fazendo suposições sobre o dia do Parto e mais uma vez dando funções para ele. No meu caso pedi para que ele me lembrasse que eu não queria anestesia e se viesse a pedir que ele deveria me dizer que o bebê já estava nascendo e não seria preciso. Outra coisa foi escolher a música para a hora do parto e pedir para que ele lembrasse de colocá-la.
Depois de abater o fantasma do medo do estrago da área de lazer (que ele descobriu que não ficaria abalada com um parto normal) surgiu a luta sobre a amamentação. Mais uma vez artigos científicos ajudaram-no a convencer da imporrtância do leite materno para o sistema imunlógiso e psicológico do nosso filho, a inutilidade danosa dos complementos, chupetas e mamadeiras e os benefícios da amamentação prolongada.
E no momento do meu parto, nasceu um papífero, que não perde a oportunidade de disseminar suas descobertas maravilhosas com quem está por perto. Das dúvidas dele, a primeira realmente teve fundamento. Com um parto tão rápido, quase não houve tempo das enfermeiras chegarem. Rompeu minha bolsa, ele ligou para as parteiras e em seguida entrei na fase do expulsivo. Ele subiu desesperado e eu o expulsei de lá. É algo que não prevíamos que aconteceria. A enfermeira chegou, Miguel estava coroado. Meu marido pegou o plástico que tinha comprado dias antes, lembrou de ligar a música. Quis me dar a mão ou me segurar. Mas eu não quis. Ele ficou atrás de mim esperando o Miguel nascer, que logo veio para meu peito mamar. Ele cortou o cordão.
Assim como temos nossas listas de apoio, meu marido faz parte da lista paterno_sp que é uma remificação da materna_sp. Lá eles trocam experiências e informações sobre a paternidade ativa.
Quando Miguel completou 500 dias ele escreveu um lindo texto, que como forma de homenagem e agradecimento a este pai maravilhoso, relato aqui um trecho para encerrar meu longo post.
"Miguel fez 500 dias de vida. Na América do Norte comemoram esta data. Agora eu também a comemorei e com muita razão. Não perdi uma noite sequer de sono. Ganhei 500 dias de alegria, de sorrisos, de abraços, De beleza, de pureza, de perfume de neném e mais que tudo500 dias de amor, de amor de pai que doa e amor que pai recebe. É indescritível a sensação de tê-lo por aqui, já andando,sorrindo. Mostrando sua personalidade, sua imensa alegria, sua beleza e postura. Creio que a maioria dos pais curte muito este momento. Mas creio ter curtido mais que muitos. Eu o vi nascer aqui em casa e cortei seu cordão. Eu pude lhe dar o 1° banho junto à mãe menos de uma hora após sua chegada. Eu pude acolhê-lo também por toda sua 1ª noite aqui, onde todos nós 3 dormimos e acordamos super bem. Desde então o vejo descer as escadas com um belo sorriso e aquela alegria peculiar". (Maurício Brum 04/07/2008)
Imagem: Arquivo Pessoal
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