
por: Kathy
"Embora estivesse ansioso por um filho, Gorlois fora indulgente, deixando que Igraine ficasse com a menina na cama e continuasse a amamentá-la, e até mesmo se abstivera de procurá-la, passando as noites com a criada Ettarr, para que ela não voltasse a engravidar, e com isso perdesse o leite. Também ele sabia quantas crianças morriam ao serem desmamadas antes que pudessem mastigar a carne e o pão.
Crianças alimentadas com água de farinha eram enfermiças e com frequência não havia leite de cabra no verão, quando estavam em condições de tomá-lo. As que tomavam leite de vaca ou de égua tinham vômitos e morriam muito amiúde, ou sofriam de soltura intestinal e não resistiam. Por isso, ele deixara Morgana mamar no peito, adiando assim a chegada do filho que desejava, por mais um ano e meio,no mínimo. Igraine tinha pelo menos essa razão para lhe ser grata, e não reclamaria, mesmo que ele lhe fizesse logo outro filho." (trecho do livro As Brumas de Avalon - A Senhora da Magia - Marion Zimmer Bradley - p. 19)
(...) "Quando a missa acabou, porém, os homens reuniram-se do lado de fora da igreja, e Gorlois apresentou-lhe a esposa do Rei Uriens, de Gales do Norte, matrona gorducha e solene, e a esposa de Ectório, que se chamava Flavila, mulher sorridente, não muito mais velha do que Igraine. Conversou com ambas por alguns momentos, (...) mas o pensamento de Igraine afastou-se: pouco interesse tinha para ela a conversa das mulheres, e suas maneiras contritas a cansavam.
Flavila estava no sexto mês de gravidez, a barriga começando a aparecer sob a túnica de estilo romano, e depois de algum tempo a conversa centrou-se em suas famílias. Flavila já tivera duas filhas, mortas de soltura intestinal no verão do ano passado, e alimentava esperanças de que, desta vez, teria um filho.
A mulher de Uriens, Gwyneth, tinha um filho mais ou menos da idade de Morgana. Fizeram perguntas sobre a filha de Igraine, e discutiram sobre a eficiência dos amuletos de bronze contra as febres de inverno, e sobre a simpatia de colocar o livro de missa de um padre no berço, contra o raquitismo.
- É a má alimentação que causa o raquitismo - esclareceu Igraine - Minha irmã, que é sacerdotisa-curandeira, sabe que nenhuma criança que tenha mamado durante dois anos completos, num peito sadio, jamais sofre de fraqueza, e que isto só acontece se ela for entregue a uma ama-de-leite desnutrida ou se for desmamada cedo demais, e alimentada com água de farinha.
- Eu acho isso uma superstição tola - opinou Gwyneth - O livro de missa é sagrado e eficiente contra todas as enfermidades, sobretudo contra as doenças de crianças pequenas, batizadas contra os pecados dos pais, e que não cometem nenhum pecados elas mesmas.
Igraine sacudiu os ombros com impaciência, sem querer discutor esse absurdo. As duas continuaram conversando sobre simpatias para doenças infantis enquanto elaolhava pra um lado e para o outro, esperando uma oportunidade para deixá-las." (trecho do livro As Brumas de Avalon - A Senhora da Magia - Marion Zimmer Bradley - p. 56)
Poxa, que pena que ainda não existia o Mamíferas na época do rei Arthur. Igraine, mãe da futura sacerdotisa de Avalon Morgana, está no caminho certo usando o que as outras mulheres da época (só da época?) não pareciam fazer. Ela obedecia sua intuição de mãe e utilizava como parâmetro seguro as bem sucedidas experiências familiares.
Achei engraçado a parte em que ela privilegia a amamentação e a cama compartilhada e com isso o marido vai dormir com a empregada porque me lembra alguns comentários que já recebemos, dizendo que ao darmos "mais atenção para as crianças do que para os pais", perderíamos os maridos. Acho que a Igraine deve pensar como eu pensaria: bom, se o marido é um imbecil a esse ponto, melhor que se vá mesmo, não é? rsrs. Correndo, aliás!
Interessante também a conversa com as outras mães, Igraine tentando abrir as cabeças das duas sem sucesso, e depois desistindo num claro "sorria e acene" da época medieval. Quem nunca se viu aí numa conversa parecida? Não estamos obviamente tocando em nenhuma questão religiosa, mas é triste pensar que ao invés de amamentar seus filhos elas preferiam acreditar no que diziam os padres (aí representando a autoridade suprema da época, aquela que não podia ser contestada), em detrimento à saúde dos próprios filhos.
Pena mesmo que a Igraine não podia ler o Mamíferas. Se lesse, ela ia saber que é perfeitamente possível e desejável continuar amamentando, mesmo grávida, se é que era isso mesmo o que ela desejava (acho que não!) rsrs. De toda forma, Aqui por exemplo temos várias informações sobre isso, para o deleite das Igraines modernas.
Enfim, acabei de ler esse livro na semana passada. Estou agora no segundo volume, que começa, aliás, com uma forte cena do parto da Morgana, filha da Igraine. Daqui um tempo escolho novos trechos mamíferos para dividir com vocês! Leitura recomendada!
Imagem: http://semantink.com/wordpress/wp-content/uploads/2009/11/list81.jpg
11 comentários:
Kathy,
Esse livro é otimo! Li há muitos anos, devorei a série (acho que eram 5 livrinhos, não é isso?) em poucos dias.
Lendo seu post fiquei com vontade de ler d enovo, mas hj com uma visão renovada, transformada, sobre a vida.
Lembrei tb do filme Maria Antonieta, onde por alto é abordada a maternidade na época - as mulheres nobres não amamentavam, era considerado até um absurdo. O poder do feminino, a história comprova, sempre foi considerado uma ameaça.
E cabe a nós considerarmos esse poder, nos apropriarmos dele e usá-lo pra tornar esse mundo um lugar melhor :-)
beijo
Renata
Engraçado, ontem mesmo comentei deste livro, exatamente pela mulher, com M maiúsculo que ele nos mostra, com dores, amores, fortaleza, amo. Li quando era ainda adolescente e muito brava com a menstruação e meu ser mulher. Minha sábia irmã sempre me dizia, você sente cólicas porque não aceita sua condição de mulher. Credo! Para mim parecia que junto com esse "aceitar" viria junto toda a triste condição da mulher contemporânea tão cobrada e oprimida, como belamente vcs discutem aqui no blog. Voltando ao livro, há um trecho que Morgana menstrua nos campos, como sinal de fertilidade, abençoar a primavera. É lindo, assim como todo o livro e aos poucos fui me abrindo e entendendo o quão maravilhoso é nosso ser feminino e que a "condição" que minha irmã me falava nada mais era que sublime. Ao me descobrir assim,com a ajuda de pessoas queridas e bons livros, tudo mudou, não senti mais cólicas, ao substituir toda a contrariedade que eu sentia, por prazer, por pura felicidade e agradecimento. Em tempo: uma preciosidade o blog de vcs, seguirei sempre, um grande beijo.
Nossa ei lí esse livro tão novinha, foi o primeiro livro "de adulto" que lí, pedi uma indicação pra minha mãe e ela me deu o primeiro volume, tinha 13 anos.
Fiquei passada, amei, foi tão transformador, entrei na adolescencia com o pé direito, e quando pergunto pq exatamente ela me indicou esse livro ela fala que não sabe direito, eu aposto em intuição mamífera. Lí depois mais umas tantas vezes, e me deu saudade, vou ver se encontro um tempo pra ler de novo.
Realmente é super mamífero.
Mariana
Também estava comentando esse livro com minha amiga Bárbara, na sexta. Agora estou lendo A Tenda Vermelha, quando tiver um tempinho leia tb. Lindíssimo, chorei nas cenas de partos das mulheres...
Adorei o post, Kathy! Delicioso!
Me lembrou meu marido lendo livros da série Duna do Frank Herbert (conhece), que me chamava quando lia a descrição dos partos. hehehe
Beijos!
Amo esse livro! Os dois primeiros são fantásticos, pois descrevem as mulheres da época e realmente vemos como a nossa sociedade ainda é a mesma, guardadas as adaptações!
Já li e reli umas 5 cinco vezes e a cada vez me encontro mais em determinados trechos!
Amo a idéia das mulheres evidenciando seu lado feminino e encontrando nisso a força necessária para viver a vida com sabedoria!
Beijos!
Nine
www.minhapequenaisis.blogspot.com
Li e estou relendo esta coleção. O post foi muito legal. Mas discordo de uma coisa: Igraine não precisaria ler o mamíferas se este existisse, pois sua sabedoria estava alicerçada nas práticas pagãs, inerentes a toda filha de Avalon.
O mamíferas é que teria uma fonte bem legal de conhecimentos para passar às outras mulheres.
Beijos carinhosos,
Camila.
São quatro livros!! Eu sou apaixonada pela série!! Áliás por tudo que a autora escreveu, os quatro livros das brumas na verdade são o final da história que tem início antes de atlântida e vem num ciclo de reencarnações até desebocar em Igraine que será a mãe de Morgana e do Rei Arthur, são muitos livros antes desses quatro que são os mais famosos, vc vai adorar Kathy, é repleta de PODER FEMININO!!!
A Tenda Vermelha é maravilhoso também, chorei um rio e meio lendo, vale a pena!!
Oi Kathy, engraçado, as Mamíferas reparamos nos mesmo parágrafos!!! rsrsrs Leí esse livro durante os primeiros meses do meu pequeno, faz um ano já!!! mas infelizmente não tem muitos trechos mamíferos pela frente! embora a historia seja apaixonante! Continue curtindo!
Eu li a tanto tempo... vou reler! obrigada pela dica!!
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