por: Kathy
Nos comentários desse post aqui surgiram questões das nossas leitoras sobre partos traumáticos e como superá-los. Como já falei um pouco aqui antes nesse post, eu também passei por um parto normal hospitalar cheio de intervenções chatas e que poderiam ter sido evitadas. Reescrevo abaixo um trecho:
"O que aconteceu comigo no meu parto foi o chamado "efeito-cascata" de intervenções. Por estar num lugar onde não me sentia a vontade (hospital), estava insegura, sem uma doula (uma acompanhante de parto), e com o pai do meu filho, que estava tão apavorado quanto eu.
Num certo momento do meu parto a dor das contrações estava insuportável. Eu então pedi a anestesia, o que não era minha idéia inicial (o plano era parir naturalmente). O problema foi que, por estar anestesiada, quando chegou a hora de fazer força para o bebê nascer, eu morria de medo pois não sentia nada! Não conseguia saber se estava fazendo força demais ou de menos, não controlava mais meu corpo e me travava com medo de "rasgar"...
Então me foi sugerida a episio, que eu aceitei prontamente. Poderia ter tido outra opção? Com toda certeza! Talvez o médico pudesse ter amparado meu períneo, talvez a anestesia pudesse ter sido um pouco mais fraca, a ponto de que eu conseguisse controlar minha própria força. Talvez até se eu estivesse melhor amparada, não tivesse nem chegado a pedir a anestesia."
Não tive o parto completamente natural que pretendia, sofri pacas com a recuperação da episiotomia, fiquei super magoada com o médico que subiu em cima de mim e empurrou minha barriga com o cotovelo para ajudar o nenê a sair (um procedimento antiquado, condenado, grosseiro, que pode machucar a gestante E o bebê, chamado manobra de Kristeller). Mas apesar de tudo isso, eu sei sim que fiz uma coisa muito difícil: consegui parir meu filho de parto normal num hospital de convênio e com equipe de plantonistas.
Não digo que tive um trauma com meu parto, mas foi sim complicado digerir algumas coisas dele. Mas, de coração, preferi transformar essas pequenas tristezas em aprendizado, em crescimento mesmo. Não tive o parto dos sonhos, mas aprendi muito com essa experiência, cresci demais, ganhei forças, e hoje me sinto uma mulher muito mais forte, poderosa e confiante no meu corpo e em mim.
Eu tinha vontade de parir em casa, mas acabei desistindo da idéia porque a família não ia concordar, porque iam me achar maluca, porque se acontecesse alguma coisa eu ia me culpar, etc, etc, mais mil desculpas desse tipo. Não banquei, mesmo. Fiquei querendo querer e colocando a culpa nos outros. Que os outros vão achar? Que vão pensar?
Só que na hora do parto, a dor quem sentiu fui eu e não a família. Quem teve que se recuperar da episio fui eu e não os vizinhos que iam me achar maluca. Quem teve que ficar 3 dias no hospital internada mesmo estando super saudável e doida pra ir pra casa só porque "era rotina" fui eu e não os outros. E mais um bando de coisas que me submeti porque resolvi colocar os outros na frente e deixar minhas vontades pra trás.
Acho que o que mais me doía era perceber que não poderia nunca voltar atrás e fazer de novo, aquela foi a única chance, não tem como recuperar. Me lembro de escrever para algumas amigas em listas de discussão: não façam como eu e tantas outras que tem o primeiro parto no hospital para depois de verem como é algo simples terem o segundo em casa. Fiquem direto em suas casas, comecem acertando, rs... Ah, se eu pudesse voltar no tempo!
Mas não posso, ninguém pode! Então, restam os aprendizados. Aprendi que a protagonista do parto é a mulher, e o que ela quer, mas quer de verdade, deseja mesmo, do fundo do coração, tem que ser a prioridade. A única pessoa que tem algum direito a opinar sobre o parto é o pai da criança. Mas ele deve entender que o filho é também dele, mas o corpo é nosso, o processo é nosso, a dor é nossa, e por isso quem tem que se sentir segura é a mulher. Eu acredito verdadeiramente que se a gente quer mesmo alguma coisa, de coração, se acredita mesmo em algo e confia que é a melhor escolha, a gente consegue fazer com que as pessoas entendam isso.
Hoje em dia não estaria nem aí pra família, pra vizinhos, pra nada, só mesmo pra o que EU quero, e sem a minha experiência de parto, isso não aconteceria, eu não teria essa força que sinto em mim hoje. Portanto, como eu respondi para as meninas que nos contaram histórias de partos traumáticos, façam limonadas de seus limões, aprendam e cresçam com as experiências ruins, para conseguirem fazer diferente numa próxima vez.
Se a dor for muito forte, busquem ajuda terapêutica. Um psicólogo, um terapeuta, alguém com quem dividir o que aconteceu de ruim. Conhecer e conversar com outras mães que passaram pelas mesmas experiências doloridas também pode ser interessante. Escrever um relato de parto também pode ser extremamente doloroso, mas curador ao mesmo tempo. Eu mesma escrevi duas versões do meu relato de parto. Um mais "ocitocinado", romântico, e outro, um ano depois, mais realista, colocando o dedo em algumas feridas, sabem? Me fez muito bem encarar a realidade sem fantasias, sem retoques.
Essas são as minhas sugestões, queridas. Boa sorte e que a tansformação de lembrança ruim em aprendizado venha rápido para vocês. Boas limonadas!
Imagem: Getty Images
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11 comentários:
Puxa Kathy, as tuas palavras me tocaram demais. Posso dizer que hoje, quase um ano depois do nascimento da minha filha não estou completamente recuperada, a cicatriz existe na minha barriga e principalmente na minha alma. Mas estou aprendendo a conviver com ela.Concordo muito contigo na parte que tu diz que se não fosse tudo que aconteceu tu não teria a postura que tens hoje. Comigo é exatamente assim. Hoje pensaria menos "em todo o resto" e mais em mim e nas coisas que eu acredito, mas essa convicção só ganhou força depois da traumática experiência que infelizmente precisei passar, enfim...na vida tudo é aprendizado mesmo, né?
Estou ensaiando para fazer meu relato de parto desde o dia que saí do hospital, mas antes eu sentia muita revolta e mágoa e escrever assim não seria legal. Hoje muitas questões estão mais claras para mim e acho que o relato sairá perto do aniversário da minha filha, em 25/05 (acredito nos ciclos da vida).
Parabéns pelo post!
Bjão
Hum...gostei da idéia de escrever! Parece que escrevendo e lçendo, conseguimos encarar os fatos de frente e assim, tentar lidar com eles.
Acho que no meu caso, vou precisar de uma boa preparação antes de engravidar novamente. Como ei tive S.P (Síndrome do Pânico) depois do parto, eu achava que ia morrer a qualquer momento...eu ainda fico pensando: Nossa....passar por tudo aquilo de novo, acho que não vou aguentar...vou morrer...enfim...é tão difícil conviver com esses pensamentos...
Mas, pelo seu depoimento, tenho esperanças que vou conseguir ter mais um bebe, e ficar bem. Que Deus me ajude tbm. :) Confio nele.
Eu tbm vou pensar assim, como vc disse: Puxa, sou uma vencedora! Conseguí ter um parto normal, num hospital de convênio, com médicos plantonistas!!!
É isso aí...
Por isso...somos mulheres!!!
Beijinhos
Olha... quero dar os parabens a vcs meninas... terem coragem, ou pelo menos, a vontade de querer um parto sem muita intervenção médica é surpreendente!!
Eu sinceramente tive a minha primeira de parto normal, mas com a episio (embora eu nem soubesse o que era isso), mas senti dor sim, fiz força sim e uma enfermeira tb "subiu" por cima pra empurrar o bebe...
Acho que por ser "marinheira de primeira viagem" nao sabia quase nada em relaçao ao parto, nem das possiveis intervenções. A unica coisa que pedi sempre foi querer o parto normal.
Sinceramente hj nao existm "mracas" nesse dia, apenas lindas lembranças de uma dos dias mais feliz da minha vida, minha recuperacao foi tao boa que 4h depois de dar a luz, ja fazia perna de indio na cama do hospital.
Bom, parabens mais uma vez e aqui fica a dica reforçada, escrevam sobre esse dia, tenho certeza de que algumas "feridas" serão mexidas e quem sabe pra cicatrizarem de vez?
Coragem!!!
Bjs
Excelente seu texto. Me identifiquei bastante.
Parabéns pela clareza de ideias.
Um abraço, Ana Lucia.
Comigo dessa segunda vez aconteceu um pouco o contrário.
Só não banqueia a idéia de parto domiciliar por causa do financeiro, de resto na minha cabeça tava tudo muito bem decidido e formado.
Tive que brigar MUITO, muito mesmo com todo mundo que convivia e fazia com gosto e estava tão convicta do que queria que a dificuldade em assumir o meu "fracasso" foi justamente "o que os outros vão dizer, depois deu ter afirmado tanto que queria parir?", passei por tudo que passei pensando no quão fraca ia aparentar pros outros, já não ligava mais pra mim.
Ainda não consegui escrever relato nenhum, até o fato de ser "relato de parto" me incomoda pq penso logo em seguida "não pari, como vou relatar um parto se não tive um?" e me machuca muito pensar em todo o processo, mas ao mesmo tempo me tranquiliza saber o quanto lutei. É uma via BEM dupla, e bem dolorosa.
Quem sabe um dia eu consiga relatar o que aconteceu no dia que minha pequena número dois chegou a esse mundão né?!
Beijos!
Kathy,
Eu fui uma dessas amigas que vc escreveu isso. Somado com a frase dita pelas enferemeiras obstetras que me atenderam no meu PD, com as palavras da Ana Cris, os relatos de parto e finalmente a visão do Leboyer do nasciemnto do ponto de vista do bebë, eu optei por parir em casa. Suas lagartas fecundaram lindas borboletas, seus questionamentos podem mudar a visão das pessoas. De certa forma, se vc não tivesse me apresentado a lista eu tivesse desistido do meu PD por strepto. Eu ainda estava no caminho do empoderamento que só se concretizou, de fato, no meu parto. Da sua dor de não conseguir o perfeito, vc semeou a possibiolidade de perfeição em mim. Por isso sou ETERNAMENTE grata por ter te reencontrado no turning point da história do meu parto.
Beijos nos pés.
O meu parto foi um desses aí, igualzinho. Chamam de "normal", mas se aquilo é normal perdi o significado da palavra.
A diferença é que não ficou nenhuma cicatriz, nem física, nem sentimental. E não lastimo nada.
De fato, as intervenções incomodaram-me e apesar de não terem gerado traumas, desejo que no próximo seja diferente, que eu tenha mais poder de decisão. E vou conseguir isso, aposto.
Um abraço!
Michelle
Kathy,
Riquíssimo texto. Eu tbm fiz ótimas limonadas dos meus limões e agora à espera de um bb de 15 semanas planejo meu PD como EU quero!
Bjkas nos pés,
Carol da Luna e de mais um anjinho no ventre.
Bom gente, qdo eu descobri minha gestação desde o inicio tinha preferencia pelo parto normal, minha gestação evoluiu pra alto risco e com 35 semanas tentaram induzir um parto, o qual chamaram de " normal" sofri muiiito ! Foram 36 horas na ocitocina, sentindo dores horriveis, com a bolsa rota nas ultimas 12 horas, tomando antibiotica intra-venoso, pra so então fazerem uma cesárea a qual chamaram de " emergencial" ! Graças a todo esse sofrimento tive Depressao pós parto, as consequiencias estão em mim até agora, 6 meses depois, choro muito ainda qdo lembro de partes do que passei, nao tive permissão para acompanhante e nem visita durante o trabalho de parto induzido, sei lá, amo ser mãe, mas por mim paro aki msm !
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