por: Kalu
Nossa sociedade é regida pelo medo. Medo de engravidar e perder o sucesso, medo de não engravidar, medo de perder o bebê, medo do parto, da dor. Medo de engordar demais, medo do bebê não engordar, medo do peito cair ao amamentar, medo do choro, medo do sono, medo, medo, medo.
E quando sentimos medo procuramos por segurança e a tecnologia torna-se um remédio para este mal e um perigoso instrumento quando usado indiscriminadamente. Durante a gestação, por exemplo, são milhares de exames para ver se está tudo bem. Este monitoramento constante é um reflexo de que vemos a gravidez como uma doença, o corpo da mulher como uma bomba relógio pronto para matar o ser que abriga ou se autodestruir.
Nesta busca pelas falhas, deixamos de curtir o momento mágico e transformador que é a possibilidade de abrigar a vida. Precisamos da muleta da tecnologia para ter a sensação da gravidez e saber que tudo está bem. O bebë dentro faz menos sentido do que aquele visto na tela. E não foi apenas uma vez que ouvi relatos de mulheres que contam que no final da gestação foram inúmeras vezes ao hospital para saberem se estava tudo bem com o bebê, que já sem espaço, costuma mexer menos.
E a cesárea é a evolução tecnológica do parto para evitar que perigos aconteçam na hora do nascimento em que a vagina assassina costuma causar sofrimentos ao pobre bebê. Ninguém diz a esta mulher que a cesárea eletiva mata mais do que partos naturais. E ela não quer ouvir porque nos quatro cantos há berros de medo que ela quer calar passivamente.
Quando o bebê nasce, na cabeceira da cama, o telefone do obstetra é substituído pelo do pediatra. A mamadeira é um alento para monitorar o quanto o bebê mama, uma vez que com o peito é impossível. A balança vale mais do que ver um bebê magro, porém esperto e feliz. Há números, curvas que os bebês devem seguir com rigor e caso algum saia da normalidade, uma avalanche de investigações tecnológicas são tomadas. E o bebê que engorda no seu ritmo, com leite materno, recebe um leite artificial para voltar nos padrões.
Neste final de semana ouvi a pior das justificativas para uso de leite artificial: dar o peito é coisa de pobre. E a santa ignorância ainda dizia que a Organização Mundial de Saúde faz campanhas e diz que o leite materno deve ser oferecido exclusivamente até 6 meses e no mínimo até 2 anos, pois estamos falando de uma população basicamente de pobres e subnutridos. Essa mulher não amamentou seu filho e tem orgulho de ter dado leite artificial em embalagens que custam nada menos que a bagatela de 70 reais. Salve a tecnologia.
Sem contar que parece que as doenças se tornaram tão comum como as catástrofes ambientais. Perdi a conta de quantas crianças foram diagnosticadas de refluxo oculto, mesmo engordando alguns gramas por mês. Criança agitada já recebe diagnóstico de hiperatividade e vivem a base de medicamentos. Assim como as cesáreas são indicadas pelos motivos mais tolos, a indústria farmacêutica parece ser a mais beneficiada com nossos medos.
Enfim me sinto tão perdida neste mundo tecnocrata. Ainda bem que encontro ecos neste mundo mamífero que acredita que a verdadeira força vem do natural, que o melhor leite e do nosso peito, que as doenças podem ser tratadas com homeopatia.
Acredito que em breve considerarão o sexo perigoso, assim como cesárea se tornou o meio tecnológico de trazer a vida. Para gestar só restará a opção da inseminação para seleção óvulos perfeitos.
No meu interior espero que possamos reverter este triste destino e é por isso que estou aqui. Espero viver para ver o dia que a força da natureza volte a ser mais forte que a doença da tecnologia e esta sirva apenas para nos servir quando todos os meios naturais verdadeiramente falharrem.
Olá!
Mudamos de endereço.
Você pode nos encontrar em www.blogmamiferas.com.br a partir de agora.
5 comentários:
Tirou as palavras da minha boca Kalu.
Tenho medo do futuro que deixaremos pra nossas crianças se não fizermos nada de diferente. E o pior é que as pessoas de 'mais estudo' que deveriam disseminar dar o exemplo são as piores, pois se 'norte-americanizam' e acabam fazendo tudo errado.
Esses dias mesmo estava pensando na questão do refluxo, pois na minha familia 1 dos 11 netos da minha avó teve, enquanto agora 3 em cada 5 crianças tem. Mas de uma coisa essa 'ignorante' que você citou tem razão, mães que tratam os filhos com remedios antigos (e homeopatia) e são o peito até mais
tarde são mesmo as mais pobres. Ou alguem já viu médico do SUS mandar dar leite artificial que custa R$70 a lata?
Se reclama de muita coisa de saude no Brasil, mas fiz meu pré-natal pelo SUS, só com duas ultrassonografias e sem nada desnecessário. Meu parto tambem foi em hospital publico, com medicos de plantão, sem que minha filha fosse pra berçário(nem tem no hospital, referencia aqui no sul como humanizado). Todas as consultas dela até um ano foram na rede publica e a medica tirava todas as minhas duvidas sobre amamentação e nunca deu nenhum remedio pra minha boneca. E hoje com um ano e 5 meses ela começou a ir em uma creche da prefeitura, onde não tem aula de informatica (pra que com essa idade?)e onde as crinças brincam na terra e podem, de verdade, serem crianças.
Beijos e desculpa o mega desabafo, mas muita gente me critica pela criação da Gabi, mas acordo todo dia um bebe feliz e amado.
Amanda, pior é que já trabalhei no SUS como assistente social e atendia muitos e muitos casos de receitas de pediatras do posto indicando leite artificial, inclusive algumas desses de 70 reais. O que aconte é a mãe não seguir a receita e dar leite de caixinha mesmo, vi até bebê de um mês indo parar na UTI e quase morrer por a mãe continuar dando o leite de vaca de caixinha para o RN intolerante à lactose.
Quando a rede de serviços públicos oferece um bom atendimento, seguindo padrões da OMS, humanização, etc, com certeza é tudo de bom. Mas eu busco ajudar numa concepção de mundo em que se tenha acesso ao melhor por informação, por condições dignas, não por ignorância e pobreza.
Sinceramente, não sei o que é pior, a ignorância pela falta de acesso ou a ignorância desejada por quem pode ter acesso. Triste!
(nada pessoal, ok? apenas uma reflexão inspirada em seu comentário.)
Bjs
Tava pensando nisso essa semana...Já que inventaram a cesárea evitar o medo da dor de parir, logo podem inventar de anestesiar a vagina das meninas na primeira transa também, para evitar a dor do rompimento do himem, kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
Kalu, parabéns pela organização do seu texto...nossa, nunca pensei que todos os meus pensamentos pudessem ser colocados assim no papel!!!!! rsrs
Deixo aqui então o meu depoimento sobre este assunto; eu, na maternidade, havia acabado de dar á Luz minha pequena...ela mamou cinco minutos depois de nascer...foi lindo.
Depois fui para a sala de recuperação.(Recuperaçãode que, se não estava doente, nem com a barriga cortada???) ok.
Me disseram que ela ficaria comigo o tempo todo...mas quando chegou a noite vieram busca-la. (??) Quando eu olhei para o carrinho que ela estava na maternidade, ví uma mamadeira pequenininha, com restinho de leite. O QUE???? Eu com os peitos cheios de leite, perguntei: Vocês etsão dando leite artificial??????? Não mãe...só de madrugada, para vc poder descansar... e eu dise que de jeito nenhum, exigia que a enfermeira trouxesse ela para eu poder amamentar. Mas o que teria acontecido se eu não tivesse visto, ou falado nada? Será que eu iria conseguir amamentar depois em casa?? Será que ela iria mamar até um ano e meio como fez?????
O que eu percebí que: ainda hoje, as maternidades não dão apoio necessário para as mães amamentarem. Tem preguiça mesmo.
Uma mae que estava perto de mim, numa salinha disse: ai eu não tenho leite. A enfermeira disse: ta, eu vou pedir uma receita de NAN p o pediatra. E saiu. Que coisa TRISTE.
Eu tbm sou vista como a louca, a chata, a radical...por pensar como eu penso em relação á maternidade e afins...mas me orgulho de pensarem isso de mim; isso indica que estou no caminho certo. Porque hoje em dia o que todo mundo quer é comodismo, facilidades, anestesias, hora marcada, sem trabalhos nem esforço...
Mas...graças a Deus, não estou sozinha!!!!!!!
Beijos
Lu
Adorei seu texto! É exatamente assim que me sinto: sou uma pobre mãe (ou "mãe pobre", tanto faz, não me importo...hehehe) lutando contra os comentários negativos à amamentação prolongada.
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