Não sei exatamente o motivo, mas sinto e vejo à minha volta uma busca frenética e cada vez mais intensa pelo desenvolvimento precoce dos bebês e crianças. Como se o estágio de desenvolvimento da criança fosse um atestado de capacidade dos pais e, pior ainda, algo ensinado, treinado, como se fosse possível dar aulas de processos naturais, como se cada aprendizado novo não acontecesse com um tempo próprio para cada um. Vejo uma comparação constante entre o tempo de cada criaça para aprender coisas novas, como se as mães disputassem para afirmar, com orgulho, que o filho foi o primeiro a desfraldar, o primeiro a engatinhar, o primeiro a falar mamãe, o primeiro, o primeiro, o primeiro.
Importa quem foi o primeiro? "Meu filho andou com 10 meses!" - ouço uma mãe orgulhosa comentar. Até aí sem problemas, mas logo na sequência vem a parte ruim. "Já o filho da vizinha, ih, tem 1 ano e 4 meses e ainda só dá uns passinhos sozinho." E eu me pergunto, cá com meus botões: e daí? Estamos aqui competindo para ver quem anda mais rápido? Quem se desenvolve primeiro? Isso é mérito dos pais, por acaso? Ganhamos prêmios por termos os bebês mais "eficientes"? Não é o esperado que cada criança tenha seu tempo próprio de desenvolvimento, e que isso seja respeitado, e não forçado, cobrado?
Por que as comparações com fatores externos (o irmãozinho, o primo, o amiguinho, o vizinho, a estatística) nos soam tão mais fortes e confiáveis do que acreditarmos que nossos filhos vivenciam diariamente processos de desenvolvimento muito particulares, a maioria deles muito próprios, muito individuais, e que diferem sim de indivíduo para indivíduo. Se crianças gêmeas, nascidas no mesmo dia, criadas da mesma forma, na mesma família, recebendo os mesmos estímulos, certamente desenvolverão suas habilidades em tempos diferentes, (um começa a falar antes, outro tem mais facilidade ao largar as fraldas, em um os dentinhos surgem primeiro, o outro começa a engatinhar antes, e por aí vai) por que esperamos que nossos filhos sejam iguais aos filhos dos outros?
Outra coisa que vejo muito é uma ansiedade por crianças seguras, sociáveis, independentes. Outro dia li uma matéria que falava sobre um estudo que dizia que as crianças que eram vacinadas nos colos de suas mães choravam mais do que as crianças que eram vacinadas sem a presença das mães. Quem nunca vivenciou essa situação? Outro dia, quando fui buscar o Samuel na escola, fiquei observando a movimentação da sala dele pelo vidro e ele numa brincadeira bateu com a cabeça na cabeça de um amiguinho. Ele não chorou, mas um minuto depois me viu parada na porta da sala. Na mesma hora correu pra mim chorando, querendo me abraçar, e lembro das educadoras comentarem que as crianças choram mais mesmo quando as mães estão por perto.
Voltando ao tal estudo sobre o momento da vacinação, chegaram à estranha conclusão de que seria bom incentivar a saída das mães de perto das crianças na hora da vacinação, para que os pequenos pudessem controlar melhor suas emoções diante da dor ou do medo de uma injeção. Um absurdo, já que certamente as crianças choravam na presença das mães não por quererem fazer manha, ou por não se controlarem, mas exatamente por se sentirem seguras de expressar suas emoções. Assim como meu pequeno na escola, que sente que deve "segurar a onda" do machucado quando está entre os amiguinhos, mas percebe que na minha presença e no meu colo, pode chorar o quanto quiser, e será amparado e compreendido.
Por que diabos forçar as crianças a segurarem o choro, a serem fortes, a crescerem, por que essa necessidade de que eles desde pequenos aguentem tudo, saibam lidar com firmeza e sozinhos com as dores, com as dificuldades? Haverão, é claro, momentos em que eu não estarei presente, mas é óbvio que sempre que puder estar junto é lá que ficarei, ao lado de meu pequeno, e em momento algum esperarei que ele seja forte ou que não demonstre seus sentimentos se ainda não estiver preparado para isso. Percebo esse como mais um processo natural de desenvolvimento dele, e não é porque o coleguinha já não chora mais que vou querer que meu filho também fique calado diante de uma dor, decepção ou dificuldade.
Parece que as cobranças que temos por eficiência no mundo adulto são transferidas também para nossas crianças. Estamos numa eterna busca de aperfeiçoamento, de aprendizado, de desenvolvimento, algo meio frenético, motivado pela competição de sempre, seja pelas melhores notas na escola, o melhor desempenho nos esportes, a melhor colocação no melhor vestibular, os melhores cargos, os melhores salários nas melhores empresas, e assim vamos deixando de lado o que nos dá prazer, vamos nos tornando pessoas frustradas por essa competição que não termina, deixando de lado nossas habilidades, escondendo cada vez mais nossas fraquezas... E, como se não bastasse, vamos fazendo o mesmo com nossas crianças, desde já. Será que não temos outras escolhas? Será que não dá pra esperar um pouquinho, pelo menos?
Vamos deixar nossas crianças serem dependentes, até fracas às vezes, vamos orientá-las, é claro, mas deixá-las seguirem seus caminhos e completarem seus processos de desenvolvimento com naturalidade, sem pular etapas, sem forçar progressos, sem comparações malucas. Vamos deixá-las crescer com tranquilidade, passando por cada fase sem pressão para serem os melhores e os mais adiantados, os mais seguros e os mais controlados. Apenas deixá-los viver seu próprio tempo, e quem sabe aprender um pouco com a forma deles lidarem com suas emoções e de vivenciarem cada conquista. Às vezes aprendemos muito mais com eles do que eles com a gente, podem ter certeza.
15 comentários:
Ai Kathy, teu texto me tocou muito... é a eterna coisa do ter melhor que o ser... eternas comparações...
Tudo isso pq o ser humano tem o costume de "gravitar" ao redor da mente e não do coração.
Só o que não entendo é como pode uma mãe não "gravitar" ao redor de seu coração, como pode não conseguir entender o que seu filho precisa.
É triste mesmo. E tá aí, o tempo todo pra gente ver: a criança começa a chorar "ai que feio, o fulaninho não tá chorando e vc tá aí todo manhoso"... criança tem que ser criança, se tiver que chorar, deixa chorar... se quiser rir, vamos rir... e por aí vai! Tudo tem seu tempo. E apressar pra que?! Pra torná-la um adulto frustrado...?!
Beijinhos
Lívia mamãe do Uriel (serzinho serelepe que aprendeu a "pular")
Kathy, adorei o post!!!
Sério, eu tenho evitado conversar com as pessoas na rua por causa dessas comparações que me irritam! "Nossa, como ela andou tarde, que preguiçosa! Minha filha andou com 9 meses! É porque vc leva ela pendurada nesse negócio."
Depois de cada comentário infeliz desses, na frente da Letícia (como se ela não estivesse presente e/ou não entendesse nada do que os outros falam), ela me abraça, fala mamãe e começa a chorar, sentida. Nessas horas fico uma fera, falo um monte pra pessoa que, depois, fala que sou mal-educada. Sabe, essa competição é absurda.
Agora minha vizinha deu pra competir entre a filha dela e a Letícia pra ver quem é mais alta, mais pesada... elas têm seis meses de diferença, mas a filha dela é mais pesada e maior que a Letícia sim, porque os DOIS são altos e meu marido e eu somos mais baixos. Agora, qual a finalidade disso? Se sentir superior? Não é muito mais fácil sermos felizes do jeito que somos e educar nossos filhos para serem felizes e dar-lhes o apoio que eles precisam em todas as fases da vida deles? Nada de apressar os processos, deixando-os atingi-los em seu tempo.
rarara, sabe que outro dia eu li uma mãe toda orgulhosa dizendo que o filho tinha engatinhado com 3 meses e meio, levantado com 6 meses e andado com, sei lá, não me lembro mais...
cara, engatinhar com 3 meses e meio??? respondi que os meus filhos deviam ser meio retardados, pois todos andaram depois de 1 ano... kkkk
na escola da minha caçula, a maioria dos pais acha que eu super-protejo a menina, pq sou contra ela estar matriculada numa classe de 6 anos (e ela só faz 6 anos dia 18 de novembro!!!)...
bjs
Arthur está na fase de ser cobrado por andar (01 ano e 18 dias). Já faz um tempo que parece que vão abrir uma bolsa de apostas para definir quando ele andará sozinho. E ele está frustando o pessoal.
Claro que eu, como mãe, quero ver meu filhote passar por mais essa etapa, mas não quero que ele sinta-se cobrado. Mas está difícil. Eu já falei que está tudo bem, que ele andará a seu tempo, que acho que o excesso de expectativa faz mal.
Adorei o texto, que me ajuda a ter forças para lidar com essa cobrança descabida. Ai, ai...
Beijos!
Um dos textos mais mamíferos que já li...
Amei, me identifiquei muito!!!
Adoro seus posts!
Beijão!
Parabéns pelo texto, você conseguiu expressar muito bem o quanto de insuportável existe nessas comparações e nos ajuda a lidar melhor com as "cobranças" chatas!
Vc se importa se eu reproduzir o seu texto no meu blog (com o devido link pra cá, é claro!)?
beijos, Re
Olá mamíferas. Como comentei no último post, estou acompanhando o blog há um tempo mas só agora consegui me manifetar.
Ainda não sou mãe, nem estou gestando, porém sou louca por esse mundo materno e sempre tive esse pensamento mamífero antes de saber da existência de um grupo tão lindo, que pensa igual! Aliás, esse louco sonho pela maternidade tem sido um dos dilemas de minha vida, mas vou resolver, hei de resolver.
Vocês foram a minha luz no fim do meu túnel, sempre me senti sozinha nesse barco, as pessoas me chamavam de irresponsável ao dizer que eu queria um parto domiciliar e que se desse, eu largaria tudo, mesmo que fosse por um tempo, pra cuidar de minha cria. Agora me sinto "normal", apoiada, acolhida (espero que sim) srsrrsrsrss
Espero poder estar sempre aqui ampliando essa minha bagagem materna, para um dia, colocar em prática e ser mto mto feliz como mãe. Espero que vocês não reprovem as visitas e os comentários de uma mamífera que ainda só é mamífera no coração.
Beijos
Meninas querida, obrigada pelo feedback de sempre!
Renata, pode sim postar o texto no seu blog e linkar pra cá!
Natália, acho que é muito importante vc ter consciência de todo esse seu lado mamífero antes mesmo de ser mãe, pode ficar à vontade no nosso cantinho, espero que seja muito útil pra vc daqui pra frente!
beijos de carinho pra todas vcs, sempre tão queridas!!!
Kathy, eu amei este seu texto, pois desde quando o Eduardo ( 3meses), meu filho, nasceu eu ouço tanto absurdo: ele tem refluxo oculto, e desde então depois de cada mamada, ele acordado ou dormindo, eu tenho de segura-lo em pé por 30 min. Meu Deus! Vc nem imagina o quanto de absurdos eu ouço por isso. Ninguem me intende que eu fico segurando meu filho, que tem 7 kilinhos, não por capricho meu, mas pq é preciso, uai!
Fora que já estão me cobrando até qd eu vou amamenta-lo..rsss..Imagine, só que as pessoas queriam que eu o desmamasse com 1 mes!!! Dá pra acreditar?
E só pq eu só tenho 1,50m ficam questionando se ele realmente é meu filho...sem comentarios.
Mas voltando ao texto, ele é ótimo e me deu um certo animo pra continuar sendo a mãe que eu sou e não aquela que os outros querem que eu seja.
Beijos
Adorei o texto, Kathy, lembro que muitas vezes deixei de ser próxima da minha irmã de tanto sermos comparadas (eu era a inferior, kkk).
Há bastante tempo acompanho o Mamíferas, da primeira vez que entrei só parei de ler quando já havia vasculhado todo o blog (e blogs amigos...hihihi).
Me identifiquei demais com o post anterior da Natália, que como eu, por enquanto é mamífera de coração.
Mas queria dizer o quanto considero esse cantinho lindo, aconchegante e tão importante para a revolução silenciosa que conduzimos diariamente.
Não sei quando vem o bebê, nem se vem o bebê, mas espero a sua chegada com muito colo, leite, dor e o que mais tiver direito.
Obrigada a todas do Mamíferas que me tornaram uma futura-mãe muito, mas muito melhor.
Beijos mil,
Natália Paganini.
Adorei o texto, Kathy, lembro que muitas vezes deixei de ser próxima da minha irmã de tanto sermos comparadas (eu era a inferior, kkk).
Há bastante tempo acompanho o Mamíferas, da primeira vez que entrei só parei de ler quando já havia vasculhado todo o blog (e blogs amigos...hihihi).
Me identifiquei demais com o post anterior da Natália, que como eu, por enquanto é mamífera de coração.
Mas queria dizer o quanto considero esse cantinho lindo, aconchegante e tão importante para a revolução silenciosa que conduzimos diariamente.
Não sei quando vem o bebê, nem se vem o bebê, mas espero a sua chegada com muito colo, leite, dor e o que mais tiver direito.
Obrigada a todas do Mamíferas que me tornaram uma futura-mãe muito, mas muito melhor.
Beijos mil,
Natália Paganini.
Oi,Kathy.
Tu traduziste meu pensamento sobre esse assunto.
É o capitalismo selvagem nas interrelações humanas!
Só que eu pego mais pesado quando alguém chega em mim querendo especular esse tipo de coisa:sabe,sou do tipo que diz uma resposta cretina pra comentários idiotas,assim,na lata mesmo.
Semana passada na sla de espera do pediatra da Luluka uma mãe puxou conversa sobre desfralde...a Lu tem 2a3m e nem sinal de querer desfraldar ainda,e amulher começou falar indignada "que tinha um filho de uma vizinha que já tinha 2 anos e ainda usava fraldas,blá,blá,blá"...na hora despejei que o controle de esfincteres pode levar mais tempo pra amadurecer,até os 4 anos é absolutamente normal-segundo o pediatra(que aliás,era o mesmo d filha dela).
abraço
Oi tô chegando agora e já virei fã desse blog!
Parabéns à vocês pelos posts inteligentes e bem escritos. Gostei demais de tudo que vi e li até aqui.
Esse texto sobre as fases do crescimento é demais de interessante. Eu sou o tipo da mãe que vai contra a maré... Amamento meu filho até hoje mesmo com todas as criticas que recebo incluindo o meu medico que me deu a bronca do seculo por causa disso, em noites frias meu filho vem dormir no meio do papai e da mamãe pra ficar quentinho e eu nem me preocupo se ele vai acostumar mal, enfim, faço muitas coisas que a maioria dos psicologos, medico, mães e especialista desaconselham.
Na verdade a minha teoria é a seguinte:
Um dia, meu filho terá 18 anos e não vai mais querer dormir no meio da cama dos pais, e nem vai querer saber do peito da mãe, então, vou aproveitar agora que ele ainda quer tudo isso. É bom pra ele e melhor ainda pra mim ! rsrsrs
Beijocas e mais uma vez parabéns pelo belissimo blog.
bjs
Kathi,
ÓTIMO texto..amei..tenho passado por isso ultimamente..minha filha de 13 meses e meio ainda não anda..e como se não bastasse não andar..ela fica andando de joelhos(pagadora de promessas)..já escutei de tudo...TUDOOOOOO mesmo, desde de preguiçosa..a que vai ficar defeituosa...
Tive que dar uma basta..pois até brigarem com ela estavam!!
ODEIO essas comparações!!! Não da para ficar feliz pela criança estar bem, saudavel..desenvolvendo-se no seu ritmo...
Beijocas
Fê
Ps.: Posso postar no blog da minha pequena tb?? Claro que dando creditos ....
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