
por: Kalu
É engraçado que há 60 anos, as mulheres eram educadas para se realizarem na família e no casamento. Então buscavam o companheiro que pudesse lhe dar uma vida confortável e a chegada dos filhos, muitos e seguidos, era a moeda que mostrava ao mundo a felicidade e realização.
Aquela mulher sabia que o filho menor não gostava de misturar o arroz com feijão, que outro gostava da gema do ovo mole, o terceiro não suportava molho de macarrão. Aquelas que negavam esta vida familiar eram consideradas inadequadas. Estas mulheres do lar, quando os filhos saíam de casa, sofriam da dor da inutilidade. Algumas delas sentiam uma lacuna, talvez porque pudessem sair de casa e oferecer seus talentos para o mundo.
Hoje estamos no mercado de trabalho, aceitando ganhar bem menos que os homens, sentir na pele diariamente o preconceito de ser mulher. Grande parte das pessoas passa mais tempo em empresas que em suas residências, sendo pressionadas, cobradas, ameaçadas. Sonham com o final de semana, as férias, a aposentadoria. A maior parte está insatisfeita e infeliz.
Compraram uma linda casa branca, reformaram, tem um cachorro e lindos filhos. Mas a mulher chega em casa, tarde da noite, com a cabeça cheia de problemas e filhos disputando a atenção. O sofá confortável é para lançar o corpo exausto. Sobra tempo para contar uma história, colocar as crianças na cama, que inventam mil e uma desculpas para passar alguns minutos a mais com a mãe.
O corpo cansado despenca ao lado do marido, sem forças para um beijo ou um carinho. O sono é interrompido por uma das crianças e pelos mil pensamentos na cabeça da infinitas tarefas a relizar e a culpa por não ser 2 ou 3. Aí a gente pára e diz: Há alguma coisa errada?!
Perdi a contas de quantas vezes escutei o depoimento acima e achava que também estaria nessa cena que se repete em milhares de lares. Imaginava que com 4 meses, meu filho teria que ir para a creche e eu batalharia para tirar leite materno se quisesse amamentá-lo exclusivamente por mais dois meses. Seria difícil resistir à chupeta ou mamadeira.
Mas quando segurei no colo aquele pequeno ser, tão indefeso, tão dependente, algo mudou dentro de mim. Por que vou oferecer meu tempo para uma empresa ao invés do meu filho? Qual a razão disso? Trabalhar sem ter um fixo é difícil. É preciso se encolher na máquina capitalista. Consumir menos, pesquisar mais e avaliar do que realmente precisamos. Eu não queria mais fazer o que não acreditava, queria escrever sobre este meu despertar para aquilo que sempre achei a coisa mais aprisionante do mundo.
Pensava que liberdade era sair pelo mundo e viajar, sem rumo, sem casa, tendo o chão de terra e o teto e estrelas. Não queria uma casa branca, nem cachorro, nem nada que dependesse de mim para existir. E de repente, estava lá, vivendo uma felicidade tão plena, tão intensa, servindo não para receber dinheiro, nem para ser reconhecida, apenas cumprindo um papel biológico de maneira plena.
É claro que quero que minhas habilidades sirvam ao mundo, mas que não sejam sem sentindo. Que sejam para transformar, inspirar. Acho um erro depositar toda fonte de felicidade apenas para uma pessoa. Somos múltiplas: mães, mulheres, esposas, amantes, profissionais. Estes papéis tem que existir, equilibrados e a felicidade é o farol que estamos no caminho certo.
Nem sempre tudo é um mar de rosas, mas se estamos lidando com uma sensação de vazio, cansaço acima do comum, vontade de férias, de final de semana, saudade de si mesma, é a hora de parar e reinventar a vida e a profissão.
Conheço muitas mulheres que abriram mão de uma vida pessoal em nome do trabalho e todas elas, ao cruzar a linha dos 40 anos, entraram em depressão. A depressão, na maior parte das vezes, é a saudade de si mesma, na minha opinião, o vazio que surge diante de uma situação em que não sabemos mais o que somos e o que verdadeiramente desejamos.
Não há fórmula para a felicidade, ela não está no casamento, nem na solteirice, nem na família, nem na falta dela, ela está na capacidade que temos de ter consciência que nossa vida é fruto de nossas escolhas e somos nós quem conduzimos as rédeas do nosso destino, que podemos, há qualquer hora, com qualquer idade, mudar o curso daquilo que não vai bem e começar de novo.
4 comentários:
pois é kalu, eu ando bem nesso ponto da minha vida, bem no meio do poema do drummond, olhando para a pedra e ela para mim...
amei o post,
karenina
http://www.juliaontheway.blogspot.com/
Obrigada Kalu!
Ótimo post. Parabéns!
Muitas vezes passamos os dias, semanas, meses, anos, fazendo coisas que não representam nada para nós, apenas por comodismo, pela falsa sensação de segurança, pela sociedade, enfim, por tudo e por todos, menos por nós mesmas...
Temos que seguir mais nosso coração e menos a razão.
Kalu,
Vc é uma mamífera notável...
Agora estou de licença, há 1 mês em casa, curtindo todo esse "trabalho" lindo que é cuidar da cria e da casa...Não pensei ainda como farei na hora da volta, mas creio que algo de bom aconteça porque algo de bom mudou e aconteceu comigo...
Sou mãe de 02 filhos, do Gabi hj com 15 anos e da Helena com pouco mais de 40 dias e te juro, não há nada mais feliz que vê-los crescendo aqui do meu lado.
Ler isso hj me confortou e me trouxe uma luz que espero em outro momento compartilhar.
Beijos maternos para vc
Cleide
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