por: Kalu
Era apenas meio quarteirão que demoramos quase 30 minutos para cruzá-lo. Miguel arrastava um carrinho, puxando-o pelo fio pelas calçadas irregulares da Vila Madalena. A cada 3 passos o carrinho virava e Miguel o colocava novamente na rota.
Observei que uma mulher nos olhava ao longe e quando passei por ela, a mesma disse:
- Por que você não pega ele e o carrinho logo no colo e chega a seu destino?
Respondi educadamente que eu gostava de respeitar o tempo do meu filho. Eu sempre busquei por esta paciência que a maternidade ativa me despertou. Vivia de ansiedade, pensando no futuro e nas mil coisas que tinha para fazer.
A maternidade me colocou no tempo presente e com ela aprendi a respeitar as necessidades imediatas sendo observadora e orientadora, respeitando o serpentear do rio que faz seus desenhos sinuosos para chegar ao mar. Por isso não sofri de ansiedade passadas as 40 semanas, nem nunca me conectei ao relógio para o tempo das mamadas. Às vezes ele mamava muito, outra vezes mais rápido e sua cara de satisfação e saciedade não me causavam dúvidas que apesar de meu peito nunca estar cheio e farto, meu filho estava no tempo dele, no ritmo de seu compasso, crescendo feliz e saudável.
Acho que as vezes que lidei com certo estresse foi quando desrespeitei este tempo dele, quando quis impor, por alguma razão, minhas necessidades sobre as dele: uma festa que começava muito tarde, ou uma viagem que se iniciou cedo demais.
Confesso que sentia muita ansiedade com a lentidão que meu filho comia. Queria que comesse rápido e muito. E só depois percebi que este meu hábito ruim de comer acelerado pode ter vindo desta ansiedade de minha mãe. Passei a respeitar seu tempo de comer, oferecendo minha paciência ao invés de meu desejo que ele comesse tudo aquilo que eu considerava ideal. Respeitei seu saudável ritmo de comer e perdi as contas de quantas vezes requentei seu prato para que pudesse comer tranquilamente.
Hoje sinto-me feliz em saborear o tempo dele, descobrindo a alegria do aprendizado com respeito e admiração. Porque o tempo não pára, como dizia Cazuza e o estar de corpo e alma, aqui e agora, é capaz de nos conectar com o único tempo que verdadeiramente existe e por isso foi chamado de presente.
Imagem: http://www.gettyimages.com.br/
6 comentários:
ahhhhhh, você leu meus pensamentos!!! eu sempre fui meio estressada, tudo para ontem... agora o ritmo é hoje, meu relógio é a baby júlia e o meu compasso gira no ritmo da órbita dela :)
ótimo post!
abraços,
karenina
http://www.juliaontheway.blogspot.com/
eu diria que 99% do meu stress com as meninas vêm da necessidade de apressá-las por algum horário. eu precisei viver uma vida como a minha para perceber isto, "ser assim" não foi uma escolha.
por outro lado, nos momentos de passeio sempre compartilhamos com elas das paradas, para olhar onde vai a formiga, e essas novidades todas que estão nos caminhos. por isso praticamente não usei carrinho de bb, e sempre me aflige ver criança que anda sendo levada em carrinho pra aumentar a velocidade dos pais.
mas no dia-a-dia eu ainda não consegui conciliar os horários que nosso tipo de vida exige com os ritmos das minhas crianças.
resta o consolo de que tudo é aprendizado. se servir pra que elas não repitam um dia, tá valendo.
Kalu, para você ver do que a maternidade é capaz: sempre fui muito ligada a horários, vivia com o relógio no pulso, só tirando para tomar banho e às vezes (!) para dormir. Quando meu pequeno teve alta no hospital, isso com 7 dias de vida, levei-o para casa, feliz, ansiosa. E uma semana depois percebi que tinha esquecido meu relógio no bercinho que ele ficava... :-) Ser mãe é viver em um tempo que não é só seu nem do mundo. Lindo texto!
Cada dia amo mais esse blog! Acabei de comentar com outra amiga mamífera, que os textos do blog são melhores até que o meu horóscopo...rsrsrs.
Mas é isso mesmo, a identificação com cada passo nesse caminho materno, me tira um pouco do estigma de ET em que vivo.
A questão do tempo, por exemplo, é um dos pilares da minha transformação em uma pessoa melhor, e isso que me trouxe foi, acima de tudo, a maternidade.
É como já escreveu o Caetano; "o tempo não para e no entanto ele nunca envelhece..."
Bjs bjs
Dani mãe da Clarice de 7m e meio.
Kalu, palavras mais do que sábias!
É um grande privilégio poder viver 100% no tempo dos nossos pequenos.
Eu, assim como a Roselene ainda dependo muito de horários no dia a dia, (pelo menos no primeiro período do dia), mas depois que estou em casa com a minha princesa é aproveitando tudo ao máximo e curtindo coisas que antes eu não daria atenção, tento enxergar pela ótica dela, de que tudo é novidade e tudo tem uma mágica especial... posso afirmar que depois disso tudo na minha vida melhorou muito.
Sempre prego acima de tudo o respeito pelos nossos filhos, acima de tudo mesmo!
Beijos
Realmente é um estresse ter q se preocupar com o tempo, todas as vezes q isso acontece aqui, o caldo tende a desandar.
Essa coisa de respeitar o tempo é realmente muito importante, embora por vezes difícil, mas acho q como mãe já desde a gravidez vamos aprendendo com isso e acabamos umas vezes mais, outras menos (a ansiedade é inimiga nessa hora) respeitando.
Desço uma ladeirona na Av. Pompéia, todos os dias, passeando a pé, contemplando tudo q existe no caminho, antes eu subia e descia de carrinho, um sentado e outro pendurado atrás, agora só vamos de carrinho, pq a subida é puxada. Muito melhor assim, a volta, a descida, com as paradinhas básicas, no tempo deles...
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