Eu poderia justificar de tantas, tantas formas.
Poderia dizer que ando cheia de problemas, desanimada, estressada.
Poderia dizer que hoje o dia foi cansativo. Divertido, sim, mas cansativo.
Poderia dizer que estou resfriada, febril, corpo cansado, dor no corpo.
Poderia dizer que meu filho às vezes é respondão, teimoso, que me desafia e testa limites.
Poderia dizer que ele é "moleque", que apronta bastante e que muitas vezes perco sim a paciência com ele.
Poderia dizer que chegamos em casa cansados, que ele estava com muito sono, mas que passei quase uma hora tentando fazer com que ele fizesse xixi e colocasse o pijama pra ir dormir, com ele se recusando de todas as formas possíveis, chegando a gritar, me dar tapas, chutes e a cuspir em mim, sendo que nenhum desses comportamentos costuma ser feito aqui em casa e eu não ter a menor idéia de onde ele tira esse tipo de reação agressiva.
Poderia dizer que crio ele sozinha na maior parte do tempo, que aqui em casa sou pai e mãe, e que às vezes me sinto perdida, esgotada, que não sei mais que atitude tomar e não tem como pedir ajuda de ninguém: sou eu e eu pra resolver a situação, e não tem como largar e deixar pra lá.
Poderia dizer tantas, tantas coisas, justificar de tantas formas, mas a verdade é que não há justificativas para o que eu fiz hoje. São explicações de contexto, mas de forma alguma servem para explicar qualquer coisa.
Eu dei um tapa no meu filho, e isso me entristece demais.
Foi um tapa com raiva, mesmo. Um tapa de esgotamento físico meu e um encerramento de tentativas de negociação, uma total reação, sem pensar nem por um segundo.
Para não esquecer do que senti, vou registrar aqui o olhar de susto do meu filho, o choro forte de quem não esperava tão reação agressiva da minha parte, o silêncio dele sentado na cama, soluçando ainda por vários minutos depois do tapa (tive que sair de perto dele pra me acalmar porque a situação fugiu completamente do meu controle).
Não sou hipócrita, não vivo vidinha de comercial de margarina, não sou perfeita (nem de longe) não propago comportamentos que não tenho, não tenho um discurso fora de casa e outro dentro, por isso venho aqui dividir com vocês humildemente que hoje fui incapaz de controlar minha agressividade e bati na pessoa que mais amo no mundo porque não consegui convencê-lo de fazer o que precisava ser feito de outra forma. Porque fui incapaz de discutir civilizadamente como certamente faria com qualquer outra pessoa, já que eu não saio por aí agredindo os outros.
Obviamente que não o machuquei fisicamente, não foi aqueles tapas de deixar "marcado" os dedos da mão, como alguns que eu mesma já levei, mas com certeza eu o machuquei moralmente, o que é tão grave ou pior que a agressão física. Foi um tapa no bumbum, um daqueles que são chamados por aí de "educativos". Pra mim é uma humilhação, um absurdo, uma coisa completamente sem sentido.
É claro que depois que me acalmei fui até lá conversar com ele, expliquei que tinha ficado nervosa, que ele tinha me batido e chutado e que não era legal me machucar assim como não era legal que eu machucasse ele, pedi desculpas, o abracei e o acalentei da melhor forma que pude, disse que errei e que as coisas nunca poderiam ter chegado naquele ponto, tentei também explicar onde ele tinha errado na minha opinião.
Depois de um tempo ele ficou bem, ficou alegre, não tocou mais no assunto, terminamos a noite com ele de pijama, xixi feito, lendo livrinhos e depois com ele mamando no peito antes de dormir como um anjinho.
Não argumentem que, portanto, "funcionou", já que no final tudo acabou bem e ele terminou me "obedecendo", porque ísso é um absurdo, não é nem de longe o tipo de respeito que eu gostaria que meu filho tivesse por mim: me obedecer com medo de apanhar mais forte, me obedecer no susto.
Não espero de forma alguma que ninguém passe a mão na minha cabeça e diga: deixa pra lá, isso acontece, ninguém morre por isso. Não aceito! Se você pensou em fazer qualquer comentário do tipo, por favor, poupe o seu tempo e o meu: não o faça!
Eu não quero ser esse tipo de mãe. Não quero nunca mais ver meu filho me olhar assustado depois de uma reação completamente irracional minha. Não quero repetir nenhum tipo de agressão com ele e, agora sim, esse é um compromisso que estou assumindo aqui e agora com vocês: não quero lembrar desse tapa como o primeiro, mas como o último tapa que meu filho levou de mim na vida.
Beijos tristes.
15 comentários:
Querida,
Sei bem como é sentir vontade de voltar no tempo e apagar uma ação que machuca que a gente mais ama.
Que não machuca o bumbum, mas a alma.
Nunca bati, mas já gritei, já fiquei tão, tão nervosa que perdi toda calma.
E, de fato, nada justifica mesmo.
O que fica de valioso é o compromisso de nunca fazer igual, de acordar todos os dias e tentar fazer o melhor possível.
É ter auto-crítica, sair da mesmice e assumir o erro.
Não esperava menos de uma mamífera!
Somos essenciais humanas, e por isso capazes de refletir sobre nossas ações, especialmente enquanto mães.
Tenho certeza de que foi o último tapa e tenho mais certeza ainda de que doeu pra caramba em vc tb...
Parabéns pela coragem e maturidade em se posicionar...
Assim que rompemos paradigmas.
E que a próxima leitora, consiga segurar o tapa lembrando de tuas palavras...
Beijos de muito carinhos (sem mão na cabeça), mas com abraço de amiga!
Pé
No início pensei: É uma estorinha? Depois despensei: É uma historinha!
***
Não é preciso passar a mão na sua cabeça, você não quer!
Não é preciso dar um tapa na sua cabeça, você já o fez! (rs)
***
Qual foi a pior reação? A sua? Ou a da dele?
De qualquer forma a agressão (falta de respeito)foi mútua!
***
A sua agressão está justificada! Mas e a dele?
Existe alguma forma de fazê-lo melhorar? De fazê-lo não fazer? De fazê-lo pensar antes de fazer? De fazê-lo amá-la tão intensamente a ponto de nunca querê-lo fazer? De desfazer o que já fez?
***
Beijos bem alegres pra ti Kathy!
Fran com amor...
Isso também é ensinamento:ele aprendeu que vc eh humana,que também erra,se arrepende e pede desculpas.
Vou aproveitar o texto irretocável na formulação,para aderir junto contigo nessa promessa.
//Publicamente,deixo aqui registrado,que nunca mais gritarei ou darei palamda "educativa"na pessoa que mais amo nesse mundo.//
um grande abraço
Toda experiência é válida pra alguma coisa né não querida? De qualquer jeito valeu pra reforçar tudo que você já sabe e te acrescentou mais humanidade ainda. Pro Sam também mostrou que todo mundo é plausível de erros e que podemos e devemos pedir desculpa. Tenho certeza que a sua atitude de explicar e conversar aumentou o respeito dele por você.
É por essas e outras que pra mim é cada vez mais absoluto a não-violência, a gente nunca está dentro de si nem no nosso "melhor" quando tomamos atitudes drásticas assim.
beijos queridona!
me emocionei muito com o post.
Sou contra a palmada e qualquer tipo de agressão fisica ou moral com os pequenos...
Mas tenho que reconhecer que algumas vezes já perdi a paciencia, já levantei da mesa derrubando cadeira, quando pela decima vez o filhote cuspia a comida. Já tive vontade de gritar mais alto, quando aos gritos ele queria mais uma vez mexer na tomada. Tenho conciencia de que "os desafios" ainda estão começando... Espero cada dia poder aprender a conter a ira, nesses momentos complicados, respirar fundo e esperar passar.
um beijo carinhoso
Kathy,
Eu também já perdi a paciência algumas vezes. Não bati, mas gritei. É horrível, é uma sensação horrorosa e dói demais dentro da gente. Mas vi que não adianta e sei que não é isso que quero ensinar a meus filhos: que é com agressividade que se consegue as coisas. Muito pelo contrário. Por isso, quando vejo minha pequena fazendo birra, manha, tento conversar. Sou firme, sou dura até, mas não grito, não sou agressiva.
Acho que tem funcionado. Ela me respeita, sabe quando estou brava, sabe o que não pode fazer e acaba cedendo.
Acho que o caminho é esse: sermos firmes, mas sempre tendo respeito pelos pequenos e explicando o porque das coisas.
Quando vejo que a coisa está ficando muito difícil que pode sair do meu controle, eu me afasto, fico quieta pra não gritar, para não ser agressiva. Me acalmo e volto a falar com ela, pra explicar o porque das coisas. É uma tarefa árdua, difícil, mas com carinho e muita, muuuuuuita paciência mesmo, acho que a gente consegue chegar lá.
Beijão e parabéns pela coragem de desabafar tão francamente no post.
arrasou nessa atitude de publicizar seu erro, para você mesma aprender com ele e nos ensinar um pouco mais também.
Achei mto legal vc dividir essa experiência com todas nós aqui.
Isso mostra que nem tudo é perfeito e que mamíferas tbm erram, mas sabem reconhecer seu erro.
ontem passei por isso. estou grávida de 8 meses, estava com a barriga doendo e meu filho pirraçando. gritei, xinguei, peguei com violência pra levar pro banho. aí eqto tirava a roupinha dele ele me deu um beijo na barriga... fico pensando: será q vou conseguir me controlar na próxima???
Oi querida
Não vou passar a mão em vc, não se preocupe. Só que li seu post com lágrimas nos olhos. Minha filha está no seu terceiro dia de férias e hj eu dei um tapa na mão dela. Li seu email como se EU tivesse escrito. O mais incrível, é que ela chorou e pediu meu colo..eu!!!!Que a agredi!!!me senti mal, chorei, pedi desculpas, ela disse que sim.....aí que me acabei de chorar mesmo.
Acho que a maternidade é esse exercício...é saber que não é certo e tentar não fazer novamente. Aprendemos a cada dia com nossos pequenos,e eles testam sim nossos limites, por isso vieram ao nosso encontro. Então vamos sacodir a poeira e tentar uma nova alternativa qdo esses momentos criticos aparecerem ( e eles aparecem mtos).
Grande beijo solidário.
E eu respiro, aliviada! Você é humana! Leio e leio por aqui, admiro vocês, mas às vezes me canso dessas atitudes tão "paz e amor" que vocês passam. Viver é isso, é reagir, toda ação pede uma reação, ninguém é perfeito, o mundo não é maravilhoso e finalmente você entendeu que tudo tem um limite, tudo tem uma razão, tudo pode acontecer.
Não dê mais palmadas em seu filho, parabéns pela decisão. Mas nunca mais deixe que ele a agrida também. Se não for assim, o que ele fará futuramente? Então o que aconteceu serviu para os dois.
Foi ótimo você ter contado.
Não se culpe. Ele não lembrará disso, mas certamente saberá que não pode lhe agredir, sob hipótese nenhuma. Beijo nele e em você.
Só tenho a dizer parabéns por tanta humildade. Não só em reconhecer seu erro, como tb em publicá-lo aqui para que todos nós parassemos mais uma vez pra pensar nesse assunto, que considero tão sério.
Fique bem, tá? Um beijo grande e um abraço apertado!
Mamiferas são humanas tb! rs
Mas so queria dizer que acho que o mais importante nisso tudo é o aprendizado, seu e do seu filho tb. Com esse espisódio ele aprendeu que vc erra, que na vida a gente sofre, que o outro sofre tb e, mais importante de tudo, que podemos lidar com o erro e com o sofrimento da melhor forma possivel. Sendo humildes, justos e pendindo desculpas.
Isso certamente não aconteceu por acaso e o que ocntinua valendo é seu amor por ele. Que, não resta dúvida, é imenso!
Beijo
Renata
É isso aí, Kathy!
Venho seguido por aqui e nunca tinha comentado antes. Estava lendo o blog de trás para frente e encontrei esse post. Fiquei muito emocionada porque tu conseguisses descrever exatamente a sensação que eu tinha quando eventualmente me descontrolava e batia nos meus filhos (do mesmo jeito que tu, sem machucar, mas com a violência moral, que é terrível). Em uma dessas vezes eu conversei a respeito com a minha terapeuta que é totalmente contra qualquer tipo de agressão, principalmente física, e ela me falou que a única coisa boa em uma situação como essa é que a criança fica sabendo que a mãe também erra, também se descontrola, e que isso é super importante, porque faz muito mal crescer pensando que a mãe é perfeita. A criança se sente muito mal quando pensa que só ela tem raiva e se descontrola.
Um beijão. Márcia
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