Há três dias atrás, escrevi aqui sobre irmãos, número de filhos, e parece que o tema interessou. O pessoal comentou bastante, todos comentários muito interessantes, sob diversos pontos de vista. Fiquei pensando em tudo o que foi dito, e achei que seria bacana dividir esses pensamentos com vocês. Se quiserem continuar a discussão, bora lá, que a caixa de comentários taí pra isso mesmo!
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Em primeiro lugar, que fique claro que dá pra ser feliz tendo irmãos, sendo filho único, tendo um milhão de amigos, sozinho no alto de uma montanha, ou seja lá como for. A felicidade depende muito mais de como a gente encara a vida que de qualquer outra coisa. Já dizia Sartre, 'não importa o que fizeram de nós, mas o que faremos com o que fizeram de nós'.
Isso posto, vamos às reflexões que ficaram minhocando nessa cabecinha litero-radical que vos escreve.
A responsabilidade do filho único. Fiquei pensando muito nessa idéia, colocada pela Maíra, de que quando se tem um filho único, a coisa pesa lá na frente. Os pais chegam à velhice, e não se tem com quem dividir a responsabilidade.
Eu, como tenho uma visão de família um pouco, digamos, atípica, vejo essa realidade de uma forma um pouco diferente. Eu não acredito muito nessas ligações hierárquicas do tipo "os pais cuidam dos filhos, depois os filhos cuidam dos pais". Acredito muito mais em elos afetivos que envolvem pessoas que se gostam, e que por se gostarem, e se importarem uns com os outros, apóiam-se mutuamente, cuidam-se uns aos outros, e os outros estão sempre por perto quando o um precisa. Isso, pra mim, tem pouco ou nada a ver com laços sanguíneos ou relações hierárquicas familiares. Tem muito mais a ver com afetividade, com cuidar de quem a gente ama. E aí incluem-se pai, mãe, amigos e quem mais chegar, como diria Joyce. Família pra mim é aquele povo que está ali quando a gente precisa, com quem a gente compartilha os bons e os ruins, as risadas e as barras mais pesadas. E pensando assim, não faz muita diferença se é filho, sobrinho, enteado, agregado, amigo ou filho-do-cunhado-da-vizinha. Se rola a afetividade, o cuidado, pronto, tá resolvido.
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E o dinheiro? Aiaiai, questãozinha complicada. E sempre acaba pesando. É um tal de colocar os números na ponta do lápis, despesa com pediatra, com plano de saúde, com escolinha, alimentação, lazer, brinquedos, etc, etc, etc. Eu sou partidária de jogar o bloquinho de notas na lata do lixo, pegar os filhotes pela mão e ir brincar de roda no quintal (que aliás, é de graça). Tudo bem, é óbvio que não dá pra sair fazendo filho de baciada e deixar pra pensar no resto depois dizendo que "onde comem dois, comem quatro", porque a gente sabe que as coisas não funcionam bem assim. Mas se a gente olha a questão com um olhar um pouco mais carinhoso, mais flexível, acaba percebendo que, dentro de um certo limite, dá pra se dar um jeitinho, que o que a gente achava tão indispensável na verdade nem é tão importante assim. Quanto a isso, eu sempre me lembro de uma frase pra lá de sábia da minha querida amiga Thais: "eu acho que filho sempre ganha mais convivendo com outro filho do que tendo o que o dinheiro compra". Assino embaixo Thais, em duas vias e com firma reconhecida!
Restam as diferenças... irmãos que se afastam por visões de vida distintas, caminhos opostos trilhados ao longo dos tempos. Eu posso estar errada, mas tendo a achar que isso tem muito mais a ver com a criação que se teve, com a forma pela qual se encaravam essas diferenças em casa, do que com as diferenças em si. Porque diversidade a gente vai ter que aprender a respeitar sempre, e não só com irmãos. Amigos também não pensam 100% igual à gente. Podem ter afinidades mil, mas certamente vão pensar diferente aqui e ali. E isso não precisa ser um problema. Mais uma vez, depende de como a gente encara. Respeito é a palavra chave. Aceitar que o outro pensar diferente, fazer outras escolhas, não o diminui em nada. Diferente pode ser apenas diferente, nem melhor, nem pior. E conviver com quem pensa diferente da gente também pode ser uma oportunidade bacana de enxergar o outro lado da moeda (concordo, Analy!), de olhar as situações por um prisma diferente e até mesmo de, vez ou outra, reafirmar a diferença e fortalecer nossas próprias convicções.
Falando da minha experiência pessoal mais uma vez, eu e meu irmãos somos bem diferentes. Pensamos de forma diversa sobre muitas coisas, outras nem tanto. Mas eu não preciso que ele concorde comigo o tempo todo pra saber que posso contar com ele. A verdade é que eu sei que, por mais diferenças que possam aparecer, há sempre um denominador comum, há uma estória que dividimos, há coisas que vivi com ele e ninguém mais sabe, há sentimentos que só nós dois compartilhamos, são nossos e de mais ninguém. E isso é um elo que não se rompe, uma linha delicada, quase invisível, mas inacreditavelmente firme e resistente, que nos mantém próximos, ainda que distantes.
Irmão não precisa ser igual a gente. Não precisa pensar igual, não tem que ter os mesmos planos, acreditar nas mesmas coisas, sonhar os mesmos sonhos. Irmão só precisa estar ali. Só precisa ser o que é: um pedacinho da nossa estória. Um cantinho aconchegante onde a gente se sente em casa, criança de novo, brincando no quintal de pé no chão.
Irmão não precisa ser nada. Irmão já é. Nasceu pra ser. E vai ser, pra sempre.
Bom, basta a gente deixar.
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Imagem: http://www.gettyimages.com.br/
3 comentários:
Muito legal! Me remeteu aos tempos em que, morando no campo e a 7 km de "outras civilizações", meus únicos amiguinhos eram meus dois irmãos. Quantas histórias compartilhadas!
Adoro o blog! Mesmo não tenho filhos ainda, me delicio lendo os textos e refletindo nas visões de mundo diferentes, aprendendo com a coragem de romper com os decretos do mundo. Parabéns!
Delicioso isso aqui!
Vim através do Para Francisco, e estou adorando.
Especialmente o texto de hoje, vou mandar para meus 8 irmãos... porque somos muito unidos na alegria, infelizmente. Por isso, tenho 01 filho e pretendo continuar assim, porque no meu caso, a quantidade não fez diferença.
eu não tenho irmãos. sou filha única e uma das minhas maiores frustrações é não saber como é isso: "amor de irmão"... escolhi mtos amigos e primos para serem meus irmãos, mas sei que não é a mesma coisa!
e é por isso que não quero demorar mto pra providenciar um(a) irmãozinho(a)
pro joaquim! *rs
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